quarta-feira, 1 de maio de 2013

CARTA ABERTA À PRESIDENTE DILMA




Cara Presidente Dilma,
Estava decidindo qual forma de tratamento adotaria para sensibilizar V.Exa a voltar os olhos para meus apelos. Pensei: Será que o membro de um poder escutaria o membro de outro poder? Logo descartei a possibilidade, porque tenho sentido que a falta de respeito entre os poderes e a desvalorização da magistratura vem imperando de uma forma lamentável e prejudicial à democracia deste País. De mulher para mulher? Talvez fosse mais viável, porque o DNA feminino sabe enxergar além do comum, mas logo desisti. Se até o momento V.Exa não utilizou esse dom não será agora que o evidenciará. Então, vislumbrei o que seria infalível, falar com V.Exa. de mãe para mãe, pois quem sabe assim, com a alma maternal, seus sentidos permanecerão atentos às minhas palavras.
Hoje no dia do trabalhador e no mês dedicado às mães peço-lhe um pouco de atenção.
Não vou fazer uso de teorias jurídicas ou de palavras difíceis, ou tecer considerações sobre o absurdo que é a exigência de submeter a escolha de um Desembargador ao Poder Executivo, apenas vou deixar que minha alma se expresse.
Há muitos meses venho pensando sobre os motivos que levam V.Exa, a Presidente desta nação, a não assinar as  aposentadorias e promoções de Magistrados dos Tribunais Regionais do Trabalho e dos Tribunais Regionais Federais deste Brasil.  São processos que adormecem meses e meses, quem sabe sobre mesas, dentro de armários ou gavetas em seu gabinete. Talvez, Presidente Dilma, V.Exa não esteja conseguindo, ao contrário de nós juízes, enxergar as vidas que habitam silenciosas por detrás das capas inertes e frias dos autos.
Sim, existem vidas e destinos de milhões de brasileiros que dependem simplesmente de uma assinatura de V. Exa, porque uma coisa depende da outra e o chamado "efeito dominó" é inevitável.
Os prejuízos para o Judiciário, para os jurisdicionados, e os prejuízos emocionais causados pelo emperramento da carreira e aumento substancial do número de demandas são imensuráveis, cara Presidente.
Poderia,  Presidente Dilma, V.Exa achar impertinente e dramática esta manifestação, afinal, sou Juíza do Trabalho. Do que tenho que reclamar diante de tantos problemas maiores do que os meus que afetam outros cidadãos?
É verdade, mas assim como outros cidadãos, também sou de origem humilde, estudei em escola pública, sou trabalhadora, sou mulher e sou mãe. Com muito orgulho exerço minha profissão, pois subi os degraus do serviço público pela via legal, legítima e democrática do concurso público.
Diferente de outros tempos, em que a mulher abdicava de ser profissional, há 15 anos optei por seguir a carreira da magistratura e há dois anos aceitei promoção para assumir a titularidade da 2ª Vara de Araguaína-TO, mas com a certeza de que retornaria para o Distrito Federal onde residem meu marido (minha alma gêmea) e meus seis filhos, dos quais quatro estão na faculdade e dois, ainda pequenos, 9 e 11 anos, ainda estão no ensino fundamental.
Fui promovida depois de 13 anos de carreira na vaga de um Juiz Titular que, por sua vez, foi promovido por antiguidade  a desembargador. Pois é Excelência, diante de uma carreira estagnada foram 13 (treze) anos para ser promovida e quando surgiu a chance, V.Exa protelou por mais de três ou quatro meses a assinatura da nomeação deste colega, sem motivos justificáveis, pois a promoção era por antiguidade, não havia opção de escolha, nos exatos termos da Constituição Federal, que um dia V.Exa jurou cumprir.
Foram mais quatro meses de agonia e sofrimento por não ter a mínima ideia de quando partir. Eu deveria tomar decisões junto com a minha família, alugar moradia no local para qual seria promovida, comprar passagens e me organizar para chegar ao meu destino, frear os meus projetos e do meu Tribunal, pois afinal de contas, a Juíza que me substituiria, na época, tinha também seus projetos para colocar em prática. Em que momento eu deveria conversar com meus filhos para que não sofressem por antecipação? O chamado "efeito dominó" teve início e não parou até hoje.
É certo que quando optamos por uma profissão a abraçamos com seus ônus e bônus. Sabia que teria que deixar meu marido e meus filhos por um tempo, pois não seria justo separar a família, razão pela qual decidimos, conjuntamente, que somente eu partiria. Também era certo, como disse antes, que voltaria para o Distrito Federal.
Aceitar o ônus de ficar longe da família quando não há perspectiva de retorno faz parte da profissão, mas a expectativa concreta de fazer o caminho de volta, rapidamente, e não fazê-lo é tortura.
Em situação pior do que a minha, outros colegas se encontram, pois há sete anos, permanecem no mesmo lugar, quando poderiam já ter voltado para suas famílias se V.Exa., investida no sentimento de mulher e, principalmente de mãe, pudesse enxergar as vidas e destinos que estão suspensos e marcados pela falta de uma assinatura.
Hoje, mais um processo de promoção está subjugado à sua vontade. Desde novembro de 2012 existe uma lista tríplice que foi submetida à V.Exa. para que nomeasse outra desembargadora para o Tribunal ao qual pertenço. Desta nomeação, Excelência, depende a abertura de outro processo de promoção por antiguidade advinda da aposentadoria de uma desembargadora do Tribunal, cujo processo, também permaneceu sem solução sobre sua mesa por mais de dois meses, inexplicavelmente. E, em razão dessas duas vagas, dois Titulares foram convocados para o TRT, desfalcando assim o primeiro grau; dois Juízes que estão no Tocantins, há sete anos, não podem fazer a viagem de volta; outros dois Juízes substitutos, há 15 anos, não podem ser promovidos a Titulares de Varas; dois Juízes Substitutos, que não têm local fixo para trabalhar não podem se fixarem em uma só Vara, dois outros candidatos que sonham com a magistratura não podem tomar posse como Juízes substitutos.
O "Efeito dominó" não para por aqui. Os processos que ainda eram divididos com as duas desembargadoras e com os dois Juízes Titulares se represam e  são  redistribuídos aos Juízes remanescentes, que antes já estavam abarrotados de processos e, assim, pelo excesso de trabalho e responsabilidade, a magistratura brasileira está adoecendo. Com esse adoecimento, e mesmo que esteja com saúde o limite físico e mental e a absoluta impossibilidade de se fazer mais, detêm a sede do magistrado de julgar com celeridade e os milhares de Joões, Marias, Cleonices, Larissas, Pedros, Joaquins, Josés, Tiagos, Sandras, Maurícios, Noemias, Márcios, Mários, Lauras, Gustavos... responsáveis pela construção deste País, que esperam por uma solução rápida de suas demandas para verem seus direitos respeitados para que possam ter o sagrado direito de se alimentar e a seus familiares, têm que aguardar por mais tempo.
Por mais especulações que existam a respeito das razões que levam V.Exa. a se recusar a dar andamento à vida de tantas pessoas, não posso acreditar em nenhuma delas quando passa pela minha mente a sua história de vida, cujo sofrimento, superação e glória conquistaram o meu voto.
Não acredito também que seja retaliação ao Judiciário pelo julgamento do mensalão. Nem posso cogitar a possibilidade de V.Exa. ter em mente se imiscuir na independência desse Poder, porque, com certeza, por sua experiência de vida, tem ciência de que sem Justiça independente não há democracia.
Uma mulher que passou pelos porões da ditadura, que sofreu tortura física e emocional e que tantas vezes, tenho certeza, teve que se afastar da filha seja pelas intempéries da vida ou mesmo pelas exigências da profissão, não seria capaz de submeter outro ser humano ao mesmo sofrimento.
Não vislumbro qualquer explicação política razoável para que V.Exa não nomeie o Desembargador observando a ordem das listas enviadas pelos Tribunais, considerando que não conhece o trabalho desempenhado pelos magistrados que figuram no documento.
Na certeza de que V.Exa fará uma reflexão e de que sua consciência de representante do povo lhe mostrará que o travamento do Judiciário se traduz em retrocesso e que por trás de jogos políticos existem vidas e destinos humanos que precisam seguir seus caminhos é que, assim como a fênix, a minha esperança de mulher em outra mulher, de mãe em outra mãe, ressurgirá das cinzas.
Em breve, retorno para Araguaína, me despeço do meu marido e dos meus seis filhos para cumprir o meu dever de cidadã e honrar a posição de membro do Poder Judiciário. Espero, confiante, que V.Exa cumpra o seu papel e honre a sua posição de autoridade máxima deste País.
Obrigada,
A todos os trabalhadores brasileiros as homenagens da AMATRA 10.


A todos os trabalhadores brasileiros as homenagens da AMATRA 10.

Rosarita Caron.
  

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