quinta-feira, 31 de outubro de 2013

APERTO DE MÃO - NARRATIVAS DE UM JUIZ ITINERANTE - POR MÁRCIO ROBERTO ANDRADE BRITO - JUIZ DO TRABALHO


APERTO DE MÃO





em Natividade, havia um temido proprietário de oficina mecânica; conhecido nas redondezas por tratar seus empregados com excessivo rigor; aqui as notícias correm; é inevitável tomar conhecimento desses boatos; tem que estar preparado para ouvir e filtrar ou esquecer (se é que isso é possível); recebemos uma reclamação trabalhista e agendamos audiência para a viagem seguinte; neste intervalo, a oficiala de justiça tentou por diversas vezes notificar o tal dono da mecânica, mas ele ofereceu resistência das mais diversas formas; numa delas, curiosa por sinal, pulou o muro e saiu correndo para não receber o mandado; a oficiala era muito firme, como tem que ser quem exerce este ofício; o trabalho dela me impressionava; ela agia igual um detetive; não sossegava enquanto não cumpria a ordem; nunca recebi uma certidão negativa dela; hoje ela está em Brasília; é uma excelente profissional; mas voltando ao assunto; ela conseguiu cumprir o mandado, embora o dono da mecânica tenha esbravejado de que não tinha juiz neste mundo que fizesse ele pagar direitos àquele trabalhador (aqui omito o palavrão que ele soltou na ocasião, mas que fazia referência à mãe do infeliz); foram três audiências neste processo; encontros difíceis; nenhum dos lados estava assistido por advogado; o dono da mecânica se apresentou com uma educação ímpar; dirigia-se a mim com um português polido; tratava-me como manda o figurino; “excelência”; “meritíssimo”; o trabalhador ficava com a cabeça baixa e às vezes esboçava um sorriso irônico em direção ao desafeto; num dado momento, o trabalhador olhou para mim e disse: “dotô, esse moço falou que num tem juiz nesse mundo que faça ele me pagar”; a informação realmente batia com as dificuldades da oficiala de justiça; olhei para o reclamante e respondi; “não meu caro senhor, com certeza ela não diria uma coisa dessas; ele me parece ser uma pessoa muito esclarecida, não é mesmo seu fulano? ele sabe que se for reconhecido que ele deve, ele pagará”; o reclamado exclamou, “sim, excelência, quem sou eu para descumprir uma ordem da justiça”; ouvimos as testemunhas dos dois lados; proferi a sentença; resultado procedente em parte; pelo meu julgamento, ninguém estava totalmente certo e ninguém estava totalmente errado; aquela tentativa salomônica de dividir o perseguido ideal do justo; mas ele pagou o que devia; do lado de fora do foro, todos aguardavam a saída do juiz; nesta hora temos que ser bem cautelosos; não há muita segurança na região; não há reforço policial suficiente; mas, para minha surpresa, todos queriam era apertar a mão do juiz e falar alguma coisa; contar histórias; convidar para um almoço; eu declinava os convites com um sorriso estampado no rosto, mas ouvia tudo o que falavam com atenção; isso já era suficiente para deixá-los satisfeitos; criou-se um ritual; todas as vezes que faço audiência em Natividade, fica uma romaria na frente do foro para conversar comigo; nessa hora fico sem saber o que sou realmente; juiz? padre? pastor? pai de santo? vidente? recordava-me então das lições de um desembargador aposentado que sempre me alertou: “a magistratura é um ato de amor”; e não é que ali isso fazia todo o sentido?

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

LOUCOS DE TODO GÊNERO - NARRATIVAS DE UM JUÍZO ITINERANTE Por MÁRCIO ROBERTO ANDRADE BRITO Juiz do Trabalho


LOUCOS DE TODO GÊNERO


desenho de Ailly
certo dia adentrou na sala de audiência um reclamante que demonstrava absoluta dificuldade para se comunicar; apresentava sinais claros de confusão mental; sua reclamação trabalhista havia sido reduzida a termo pela secretaria da vara (atermação); os servidores já alertaram ao juiz de que o reclamante transparecia não estar em pleno gozo de suas faculdades mentais; o diálogo em audiência foi muito difícil; o ex-empregador não demonstrava nenhuma surpresa; ao contrário, sorria a cada palavra do reclamante, mas não em tom de deboche; olhava para o juiz como querendo dizer que o reclamante era “daquele jeito mesmo”; a cidade o conhecia assim; na narrativa dos fatos, o reclamante havia se comprometido a realizar alguns serviços na fazenda do reclamado por empreitada e agora cobrava valores que o reclamado sustentava ter pagado; a indignação do reclamante residia no fato de acreditar que seu trabalho valia mais do que o acertado, do que o combinado, do que o pago; estava nítido que ele recebera o valor prometido; mesmo assim o reclamado propôs pagar R$ 300,00 para encerrar o processo; não houve acordo; marcamos audiência de instrução; e convoquei o MPT (Ministério Público do Trabalho); a audiência itinerante foi inusitada; por mais que a procuradora do trabalho tentasse convencer o reclamante de que deveria receber o valor proposto, pois a obrigação do empregador já havia sido totalmente cumprida, o reclamante não aceitava; dizia em alto e bom som que a procuradora e o juiz tinham sido “comprados” pelo outro lado; perguntava com ingenuidade e uma sinceridade dilacerante à procuradora se ela estava ali para defender ele ou o reclamado; a situação era constrangedora e ao mesmo tempo hilária; a audiência estava sendo filmada pela TV Justiça que realizava um documentário sobre justiça itinerante no Tocantins; não havia nenhum indício de afronta à autoridade, apenas uma ignorância velada pela notória confusão mental do reclamante que não possuía nenhum familiar vivo para lhe orientar; vivia na cidade à própria sorte; seria uma crueldade propor a sua interdição; privaríamos o ser de viver seu estado de loucura com liberdade? não aceitou o acordo e o processo foi julgado improcedente; a cena fez brotar em mim uma profunda reflexão sobre o ato de decidir; a função do Estado; as imagens construídas pelo senso comum sobre corrupção no sistema judiciário; a problemática educacional no interior do país; o tratamento do Estado frente à saúde mental da população; e uma única certeza: há loucos de todo gênero;

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

DIREITOS SOCIAIS E RETROCESSO: O CASO DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE DOS TRABALHADORES DO SETOR ELÉTRICO - Artigo de autoria do Desembargador do TRT 10ª Região, DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES

O Desembargador Douglas Alencar Rodrigues, da 10ª Região, vem escrevendo artigos sobre temas jurídicos de relevante importância para reflexões daqueles que trabalham com o direito. O artigo "DIREITOS SOCIAIS E RETROCESSO: O CASO DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE DOS TRABALHADORES DO SETOR ELÉTRICO" propõe reflexões sobre a base de cálculo do adicional de periculosidade devido aos trabalhadores do setor elétrico, após o advento da Lei 12.740, de 8 de dezembro de 2012, que revogou integralmente a Lei 7.369/85. Em síntese, examina se é possível adotar a base de cálculo do referido adicional prevista para os trabalhadores em geral, considerada a proibição constitucional de retrocesso no campo dos direitos sociais.
O artigo já foi publicado no CONJUR e no Correio Braziliense, Caderno Direito e justiça|CB do dia 7.10.2013
http://www.conjur.com.br/2013-out-04/douglas-alencar-lei-omite-base-calculo-adicional-periculosidade


DIREITOS SOCIAIS E RETROCESSO: O CASO DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE DOS TRABALHADORES DO SETOR ELÉTRICO

Douglas Alencar Rodrigues 

A Lei 7.369/85 dispôs sobre o direito ao adicional de periculosidade para os trabalhadores do setor elétrico, estabelecendo que o percentual correspondente incidiria sobre o salário do empregado, ou seja, com a consideração de todos os componentes de natureza salarial pagos ao trabalhador. Essa disposição acabou aclarada pela Súmula 191 do Tribunal Superior do Trabalho, implicando a concessão de vantagem expressiva ao conjunto de trabalhadores que laboravam em condições de risco acentuado pela exposição permanente à energia elétrica. 
Com o advento da recente Lei 12.740, em 8 de dezembro de 2012, foi determinada a inscrição na CLT do direito ao adicional pelo risco causado pela energia elétrica, com a consequente revogação integral da Lei 7.369/85. Embora com propósito aparente de unificar os diplomas normativos, a nova lei silenciou acerca da base de cálculo do adicional, sugerindo que a vantagem deve se sujeitar ao critério de apuração do salário base, excluídas quaisquer outras vantagens (CLT, art. 457).  
Esse nova realidade normativa silêncio tem suscitado novos debates: seria constitucional a inovação legal em questão, sob a perspectiva do retrocesso provocado na regulação de direito previsto no Texto Maior (CF, art. 7º, XXIII)? Essa inovação legal, com sentido restritivo, seria aplicável aos contratos vigentes antes de seu advento? 
Para responder a esses questionamentos, é preciso recordar, antes, que a diretriz axiológica no campo dos direitos sociais está vinculada ao norte da melhoria da condição social do trabalhador (CF, art. 7º, “caput”), disso resultando a ineficácia das inovações legais ou contratuais que consagrem retrocessos à margem das hipóteses pontuais e excepcionais previstas na própria Carta Magna e que estão circunscritas ao poder negocial coletivo (CF, art. 7º, VI, XIII e XIV). 
De acordo com a história evolutiva dos direitos humanos, que se confunde com o próprio tratamento dispensado pelas sociedades ocidentais ao postulado da dignidade humana, os direitos sociais trabalhistas, inscritos na segunda dimensão dos direitos humanos, estão gravados com a nota da denominada “dupla dimensão, objetiva e subjetiva”, que representa um dos principais avanços da teoria constitucional contemporânea. 
Sob essa perspectiva, e para além da constatação de que os direitos humanos, em todas as suas dimensões ou gerações, buscam assegurar os ideais da liberdade e da igualdade, valorizando a dignidade da pessoa humana de forma ideal e abrangente, a dogmática constitucional evoluiu para reconhecer, ao lado dos efeitos subjetivos, que conferem aos cidadãos pretensões exercitáveis perante o Estado e particulares, a perspectiva objetiva dos direitos humanos, segundo a qual devem ser compreendidos como “decisões valorativas de natureza jurídico-objetiva da Constituição, com eficácia em todo o ordenamento jurídico e que fornecem diretrizes para os órgãos legislativos, judiciários e executivos.”[1] 
Além disso, a partir do instante em que são positivados por ordens jurídicas constitucionais, os direitos humanos acabam revestindo a nota da fundamentalidade formal, da qual derivam consequências relevantes, entre as quais, na dicção do Professor Canotilho, a de que passam a constituir parâmetros materiais de escolhas, decisões e ações e controle dos órgãos legislativos, administrativos e jurisdicionais[2]  
Em outras palavras, representam os direitos humanos um conjunto de “valores objetivos básicos” que vinculam e condicionam a ação dos poderes públicos, e não apenas traduzem garantias direcionadas à tutela de interesses individuais. Normas definidoras de direitos fundamentais assumem, nesse contexto, “eficácia dirigente” em relação às ações dos poderes públicos, representando, mesmo quando apresentem conteúdo meramente programático, limites materiais negativos para a ação conformadora a cargo dos poderes públicos. 
Dessa dimensão objetiva dos direitos fundamentais advém a noção de que tais direitos, enquanto conjunto de valores comunitários, devem ser interpretados não apenas sob a perspectiva do indivíduo, mas também de toda a comunidade, na medida em que representam valores e fins agasalhados por ela, que devem ser respeitados e realizados. 
Os direitos fundamentais postos na Constituição, enquanto conjunto de valores expressos em normas jurídicas, igualmente representam parâmetros de valoração das leis e demais atos normativos editados pelo Estado, inclusive sob o prisma de sua própria constitucionalidade. 
À luz dessas considerações, ganha expressão a tese da inconstitucionalidade da Lei 12.740/2012, na medida em que, ao revogar norma consagradora de critério benéfico e silenciar acerca da forma de apuração da vantagem devida aos eletricitários, acabou impondo inescusável retrocesso, contrariando o ideal de avanço e melhoria da condição social dos trabalhadores, que vincula a ação estatal, em todas as suas esferas, no campo dos direitos sociais trabalhistas (art. 7º, “caput”, da CF). 
É preciso lembrar que “O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive.”[3] 
Ainda que superado o debate sobre a constitucionalidade da Lei 12.740/2012, não se pode concluir por sua aplicabilidade aos contratos celebrados antes de seu advento. Afinal, no instante em que é celebrada, a relação de emprego passa a se sujeitar ao complexo de normas jurídicas então vigentes: normas legais imperativas - que consagram parâmetros mínimos de proteção social (CLT, art. 9º c/c o art. 7º, “caput”, da CF) e normas de origem autônoma produzidas pelos próprios atores sociais - destinadas a ampliar os níveis de proteção já assegurados na legislação estatal (art. 444 da CLT e art. 7º, XXVI, da CF).
Em outras palavras, os parâmetros de proteção social em vigor no instante da contratação laboral configuram o arcabouço normativo que regulará aquele negócio jurídico, ressalvadas, apenas, insista-se, as alterações subsequentes vantajosas ao trabalhador ou ainda aquelas que, embora prejudiciais, sejam fruto do processo negocial coletivo ressalvado na própria Constituição da República (art. 7º, VI, XIII e XIV). 
Alterações outras, que impliquem redução dos parâmetros de proteção anteriormente estabelecidos, não podem produzir efeitos sobre os vínculos jurídicos já celebrados, sob pena de indisfarçável inconstitucionalidade (art. 7º, “caput”, da CF) ou mesmo ilegalidade (CLT, art. 468), conforme a sua natureza e objeto. Não se mostra lícito, pois, ao legislador impor redução salarial aos trabalhadores, por meio de alteração legislativa, sob pena de afronta direta e literal ao inciso VI do art. 7º da CF, como parece ser possível, a partir da Lei 12.740/2012. 
Por imposição constitucional, portanto, não pode o legislador reduzir ou suprimir os parâmetros de proteção já alcançados, sob pena de produzir obra inconstitucional, cuja ineficácia deve ser declarada pelos órgãos do Poder Judiciário. 

[1] SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 7. ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2007. p. 147
[2] CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1997, p. 349.
[3] STF, ARE 639337 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO.


sábado, 19 de outubro de 2013

CENTENÁRIO DE VÍNICIUS DE MORAES

Hoje, 19/10/2013, Vinicius de Moraes, completaria  100 anos. Nossas homenagens ao grande  poeta brasileiro.



“A bênção, Senhora!

A maior ialorixá da Bahia

Terra de Caymmi e João Gilberto

A bênção, Pixinguinha

Tu que choraste na flauta todas as minhas mágoas de amor

A bênção, Sinhô

Sua bênção, Cartola

A bênção, Ismael Silva

Sua bênção, Heitor dos Prazeres

A bênção, Nélson Cavaquinho

A bênção, Geraldo Pereira

A bênção, meu bom Cyro Monteiro

Você, sobrinho de Nono

A bênção, Noel

Sua bênção, Ary”

RECONHECIDA A ATIVIDADE DE VAQUEIRO COMO PROFISSÃO

Lei nº 12.870, de 15.10.2013 - DOU de 16.10.2013

Dispõe sobre o exercício da atividade profissional de vaqueiro.
A Presidenta da República
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Fica reconhecida a atividade de vaqueiro como profissão.
Art. 2º Considera-se vaqueiro o profissional apto a realizar práticas relacionadas ao trato, manejo e condução de espécies animais do tipo bovino, bubalino, equino, muar, caprino e ovino.
Art. 3º Constituem atribuições do vaqueiro:
I - realizar tratos culturais em forrageiras, pastos e outras plantações para ração animal;
II - alimentar os animais sob seus cuidados;
III - realizar ordenha;
IV - cuidar da saúde dos animais sob sua responsabilidade;
V - auxiliar nos cuidados necessários para a reprodução das espécies, sob a orientação de veterinários e técnicos qualificados;
VI - treinar e preparar animais para eventos culturais e socioesportivos, garantindo que não sejam submetidos a atos de violência;
VII - efetuar manutenção nas instalações dos animais sob seus cuidados.
Art. 4º A contratação pelos serviços de vaqueiro é de responsabilidade do administrador, proprietário ou não, do estabelecimento agropecuário de exploração de animais de grande e médio porte, de pecuária de leite, de corte e de criação.

Parágrafo único. (VETADO).
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 15 de outubro de 2013; 192º da Independência e 125º da República.
DILMA ROUSSEFF
Guido Mantega
Antônio Andrade
Manoel Dias
Gilberto Carvalho

Razão de Veto à Lei 12.870
MENSAGEM Nº 457, DE 15 DE OUTUBRO DE 2013
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1º do art. 66 da Constituição , decidi vetar parcialmente, por contrariedade ao interesse público, o Projeto de Lei nº 83, de 2011 (nº 2.123/2007 na Câmara dos Deputados), que "Dispõe sobre o exercício da atividade profissional de vaqueiro".
Ouvidos, os Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e da Fazenda manifestaram-se pelo veto ao seguinte dispositivo:
Parágrafo único do art. 4º
"Parágrafo único. O contrato de prestação de serviços ou de emprego a que se refere o caput deste artigo preverá, obrigatoriamente, seguro de vida e de acidentes em favor do vaqueiro, compreendendo indenizações por morte ou invalidez permanente e ressarcimento de todas as despesas médicas e hospitalares decorrentes de eventuais acidentes ou doenças profissionais que vier a sofrer no interstício de sua jornada laboral, independentemente da duração da eventual internação, dos medicamentos e das terapias que assim se fizerem necessários."
Razões do veto
"Na forma como redigido, o dispositivo não leva adequadamente em consideração a realidade econômica do setor, em especial a dos pequenos produtores, onerando o processo produtivo excessivamente. Assim, a medida poderia ter como efeito a redução da contratação de vaqueiros, enfraquecendo a categoria e gerando desemprego. Além disso, ao limitar tais garantias a estes profissionais, criaria diferenciações de tratamento em relação aos demais trabalhadores rurais e outras categorias que atuam no setor agropecuário."
Essas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar o dispositivo acima mencionado do projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Todos contra a Terceirização - Vídeo 2 (+playlist)

TUTELAS DE URGÊNCIA E SUA IMPUGNABILIDADE NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO - DES. DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES

O Exmo. Desembargador Douglas Alencar Rodrigues, da 10ª Região,  nos deu a honra de publicar, em primeira mão, artigo de sua autoria no qual  analisa os meios de impugnação às decisões judiciais proferidas no âmbito das chamadas tutelas de urgência, discorrendo, com especial atenção, para o real significado  que deve ser atribuído à jurisprudência sumulada do TST nesse âmbito.


TUTELAS DE URGÊNCIA E SUA IMPUGNABILIDADE NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO

Douglas Alencar Rodrigues, Magistrado em Brasília-DF.

Na estruturação das normas processuais trabalhistas, o legislador conferiu especial significado aos princípios da celeridade e economia processuais, diante da natureza alimentar dos créditos trabalhistas, que são essenciais à subsistência do trabalhador e de sua família. Entre as muitas disposições legais voltadas a simplificar e acelerar os procedimentos, o legislador consolidado consagrou a regra geral de que as decisões interlocutórias não poderiam ser alvo de ataque recursal imediato, embora pudessem ser objeto de reexame por ocasião do recurso cabível contra as sentenças de mérito que viessem a ser proferidas[1].  
Embora algumas ressalvas a esse postulado tenham sido inscritas na própria legislação ou consagradas na via jurisprudencial[2], a lógica da contenção de recursos contra decisões interlocutórias tem possibilitado o trânsito racional e regular das ações trabalhistas, sem qualquer prejuízo ao amplo direito de defesa. 
No âmbito das chamadas tutelas de urgência, composto pelas decisões liminares e decisões de antecipação dos efeitos da tutela, entretanto, o debate acerca da possibilidade de impugnação imediata das decisões judiciais assumiu outro significado.
Nesse específico universo, em que a tutela do direito lesado ou ameaçado reclama medidas rápidas, concretas e efetivas, o controle imediato das decisões judiciais passou a ser admitido e efetivado por meio do mandado de segurança, remédio constitucional que compõe a chamada jurisdição constitucional das liberdades e que possibilita a retificação de erros e decisões judiciais arbitrárias. 
No exercício de sua função de pacificar a interpretação do direito federal no âmbito dos órgãos da jurisdição trabalhista, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 414, que foi estruturada em três itens com os seguintes conteúdos: “I - A antecipação da tutela concedida na sentença não comporta impugnação pela via do mandado de segurança, por ser impugnável mediante recurso ordinário. A ação cautelar é o meio próprio para se obter efeito suspensivo a recurso. II - No caso da tutela antecipada (ou liminar) ser concedida antes da sentença, cabe a impetração do mandado de segurança, em face da inexistência de recurso próprio. III - A superveniência da sentença, nos autos originários, faz perder o objeto do mandado de segurança que impugnava a concessão da tutela antecipada (ou liminar).” 
Com base no enunciado do item II acima transcrito, parte da jurisprudência tem sustentado que as decisões que denegam liminares ou pedidos de antecipação de tutela não ensejariam a impetração do mandado de segurança, seja porque tal possibilidade foi restrita às decisões concessivas, seja porque, de acordo com a diretriz posta na Súmula 418 daquele mesmo tribunal, “A concessão de liminar ou a homologação de acordo constituem faculdade do juiz, inexistindo direito líquido e certo tutelável pela via do mandado de segurança.”  
Sem embargo das razões que tentam explicar essa linha de compreensão, o equívoco intelectivo parece manifesto e o resultado que produz contraria o próprio sentido da cláusula constitucional de amplo acesso à Justiça. Afinal, de acordo com a legislação vigente, a possibilidade de impugnação às decisões judiciais por via recursal ou autônoma define-se em razão da natureza das decisões proferidas, e não do conteúdo que possam assumir. Por isso, sendo irrecorríveis as interlocutórias trabalhistas proferidas no âmbito das tutelas de urgência, a mera possibilidade de configuração de erro ou de arbitrariedade judicial faz impositivo o cabimento do mandado de segurança, única via cabível para reparar eventual lesão ou ameaça a direito líquido e certo, que pode estar configurada no âmbito da cognição cautelar ou antecipatória de efeitos da tutela. 
Caso concreto recentemente julgado no TRT da 10a Região bem permite ilustrar esse raciocínio. Cuidava-se de um dirigente sindical cujo contrato de trabalho fora rescindido sem a autorização constitutiva própria de inquérito judicial. Proposta a reclamação com os pedidos de nulidade da dispensa e de reintegração ao emprego, além do pagamento dos salários do período de afastamento, foi indeferida a tutela antecipada em primeiro grau, sobrevindo, contra esta decisão, a impetração de mandado de segurança pelo trabalhador vitimado. Concedida a liminar pelo Relator, aviou a empresa agravo regimental, o qual restou provido pelo órgão fracionário competente, com base na interpretação literal das Súmulas 414 e 418 do TST.  
Assim, o trabalhador que havia sido reintegrado pela decisão liminar no mandado de segurança, foi, em seguida, novamente dispensado em razão da decisão lavrada no agravo regimental. Pouco tempo depois foi proferida sentença na reclamação trabalhista, deferindo o julgador os direitos reclamados pelo trabalhador...  
Nesse exemplo concreto, tivesse a tutela sido concedida em primeiro grau, o mandado de segurança, segundo a tese fundada na exegese literal das Súmulas 414 e 418, seria admitido sem qualquer questionamento, não prevalecendo, curiosamente, a tese de que o deferimento de liminar estaria inscrito no livre convencimento do magistrado, não violando direito líquido e certo, na forma da Súmula 418 do TST. 
O acesso amplo e igualitário à Justiça representa uma das mais expressivas características do Estado democrático contemporâneo. Muito além de representar a simples possibilidade de recorrer ao Poder Judiciário para a defesa ou salvaguarda de direito ou pretensão contra lesão ou ameaça, também alcança a possibilidade de obtenção de decisões substancialmente justas, bem fundamentadas e em prazo razoável.
O acesso amplo à Justiça representa uma verdadeira “idéia-força” que tem fomentado inúmeras proposições legislativas no curso da história recente. Antes mesmo do advento da Reforma do Poder Judiciário, entre tantos exemplos que buscaram qualificar a ação do Poder Judiciário brasileiro, nas perspectivas da celeridade e efetividade, a Lei 8.952, de 1994, introduziu o instituto da antecipação dos efeitos da tutela, promovendo uma verdadeira revolução no direito processual, pois permitiu a própria satisfação do direito, em determinadas circunstâncias, antes mesmo da própria prolação da decisão de mérito.  
No âmbito da jurisdição do trabalho, a idéia de antecipação da tutela em situações específicas já estava consagrada, embora com terminologia imprópria (cautelar), em situações como as das transferências abusivas e dispensas ilegais de dirigentes sindicais (CLT, art. 659, IX e X). 
Com as medidas de antecipação dos efeitos da tutela, inscritas nos artigos 273 e 461, ambos do CPC, a lógica do amplo e efetivo acesso à Justiça ganhou um novo significado, na medida em que os ônus decorrentes da chamada “demora patológica” do processo, aquela resultante das chicanas e expedientes protelatórios, da incapacidade estrutural do Poder Judiciário de responder em tempo razoável as demandas e mesmo do chamado “tempo neutro” (períodos em que os autos permaneciam parados, aguardando medidas administrativas de execução, como expedição de notificações, intimações etc), puderam ser compartilhados equitativamente entre os litigantes.  
Para além do próprio é sério debate em torno da existência de direito subjetivo à concessão de liminar ou à antecipação da tutela, quando preenchidos os requisitos legais, não se tratando, portanto, de matéria afeta à faculdade do julgador, é preciso que também sejam garantidos aos litigantes iguais oportunidades de defesa de suas pretensões e posições jurídicas, independentemente da posição que ocupem na relação jurídica processual, cabendo ao magistrado construir interpretações que assegurem a realização desse ideal, sob pena de inescusável inconstitucionalidade.

[1] “Os incidentes do processo são resolvidos pelo próprio Juízo ou Tribunal, admitindo-se a apreciação do merecimento das decisões interlocutórias somente em recursos da decisão definitiva.” (CLT, art. 893, § 1o.).

[2] DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. IRRECORRIBILIDADE. Na Justiça do Trabalho, nos termos do art. 893, § 1º, da CLT, as decisões interlocutórias não ensejam recurso imediato, salvo nas hipóteses de decisão: a) de Tribunal Regional do Trabalho contrária à Súmula ou Orientação Jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho; b) suscetível de impugnação mediante recurso para o mesmo Tribunal; c) que acolhe exceção de incompetência territorial, com a remessa dos autos para Tribunal Regional distinto daquele a que se vincula o juízo excepcionado, consoante o disposto no art. 799, § 2º, da CLT.(Súmula 214 do TST).


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quinta-feira, 17 de outubro de 2013

PLANEJAR - NARRATIVAS DE UM JUÍZO ITINERANTE Por MÁRCIO ROBERTO ANDRADE BRITO Juiz do Trabalho


PLANEJAR

época de chuva é um calvário; estradas deterioradas; buracos; animais na pista; falta de visibilidade; névoa; e água, muita água; o caminho se torna mais longo; troca de pneus; pane no veículo; o risco de atrasos torna-se maior; o medo de não chegar a tempo vai atormentando juiz e servidores durante o percurso; não podemos falhar com quem está aguardando ansiosamente pela solução de seu problema; a angústia não pode, entretanto, suplantar a necessidade de segurança da equipe; temos que dirigir com cautela; percebi que é preciso planejar melhor o roteiro; prever os infortúnios; pegar estrada à noite por estas regiões é uma insanidade; resolvi que um expediente (manhã ou tarde) deve ser inteiramente destinado ao deslocamento, independentemente da distância a ser percorrida (100 km, 200 km, 300 km, etc.); e de que devemos estar com antecedência razoável nos locais de audiência, nem que para isso seja necessário pernoitar no município de destino; planejar, palavra cujo verdadeiro significado nós aprendemos nestas idas;

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Todos Contra a Tercerização - Vídeo 1

Todos contra a Terceirização - Vídeo 2

MENOR APRENDIZ - NARRATIVAS DE UM JUÍZO ITINERANTE Por MÁRCIO ROBERTO ANDRADE BRITO Juiz do Trabalho


MENOR 

APRENDIZ

pedi ao diretor de secretaria para pararmos o carro em frente à oficina de ourives de Natividade; todos me falavam desta antiga oficina; queria conhecer; foi fundada por um ex-escravo; senti-me entrando num túnel do tempo; móveis de madeira bem velhos e vários adolescentes trabalhando na arte do ouro; peças belíssimas eram trabalhadas pelas mãos dos aprendizes; sempre li nos livros de direito do trabalho o ofício do menor aprendiz; ali convivi de perto com a realidade dos livros; para julgar trabalho é preciso conhecer trabalho; e eu estava ali tão aprendiz quanto aqueles menores; coisas da vida itinerante; fluida; mutante; transformadora;

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

CAFÉ DA MANHÃ - NARRATIVAS DE UM JUÍZO ITINERANTE Por MÁRCIO ROBERTO ANDRADE BRITO Juiz Titular da Vara do Trabalho


CAFÉ DA MANHÃ

O hotel de Taguatinga é um grande corredor com 18 aposentos; piso de cimento queimado; portas de alumínio; ouvimos tudo o que se passa nos quartos vizinhos; sabem até a hora que o juiz apaga a luz ou desliga a TV; privacidade zero; hora do café da manhã; a equipe já acordou mais cedo e foi preparar a sala no foro onde serão realizadas as audiências; neste intervalo, tomo café-da-manhã numa das quatro mesas do refeitório; tudo lotado; é necessário compartilhar a mesma mesa com outros hóspedes; uns puxam conversa; prefiro dizer apenas um “bom dia”; quem está de terno provavelmente é advogado; outros podem ser litigantes; não posso demonstrar uma intimidade que não existe; minha imparcialidade poderia ser injustamente questionada por quem assistisse à cena; a equipe chega para me buscar; já no estacionamento, todos os que estavam no refeitório entram em seus veículos e fazem o mesmo percurso em direção ao foro; um comboio de “reclamados” e “advogados”; sentaríamos novamente à mesma mesa, agora da sala de audiência, já constrangidos a ultrapassar aquele “bom dia” matinal para então discutirmos as causas postas a julgamento; a partir da viagem seguinte, quando chego ao hotel, já sou cumprimentado pelos hóspedes que agora me conhecem; “olá doutor, fez boa viagem?”; ali convivemos muito de perto com o nosso público; compartilhamos os mesmos obstáculos; dividimos o mesmo espaço; aprendi naquela experiência que juiz e sociedade são entes verdadeiramente indissociáveis;