Atualmente
a magistratura está sendo alvo de ataques constantes. A mídia tem divulgado
notícias que não condizem com a realidade vivida pela magistratura.
Reparem que
a campanha maciça contra a Magistratura e Ministério Público começou depois da operação
lava-jato. Será por que? A quem interessa enxovalhar o Poder Judiciário?
A imprensa
tem o dever de bem informar o cidadão e, bem informar, significa verificar as
informações antes de divulgá-las, mostrar a realidade dos fatos e não propagar
notícias que surgem ninguém sabe de onde sem qualquer preocupação ética ou
com os danos que podem causar.
Qual será
a intenção da imprensa e dos poderosos?
Os meios
de comunicação estão irmanados com o objetivo de desmoralizar os Magistrados
por qualquer coisa. A eles parece que não interessa a verdade.
Será que
os "fins" justificam os meios?
Sem o
Poder Judiciário não há garantia do estado democrático de direito.
Tempos
difíceis...
Texto de
Willian Douglas. Excelente!
Ser juiz.
Você se
encastela, reclamam.
Você tem
FB, TT ou Insta, reclamam.
Você se
cala, reclamam.
Você fala,
reclamam.
Se fala
difícil, ABNT, pós-doc, juridiquês,
é elite
empolada e distante.
Mas fale
simples, para “gente comum” entender,
misture
“você” com “tu” e...
dirão que
não estudou direito, nem Direito:
vão
corrigir seu português como se fosse em um concurso público!
(Aviso
logo: misturo você e tu, e escrevo autoajuda e ajuda do Alto... Falo termos
simples, e me misturo com as partes.
Alguns
erros de português são mais bonitos de
escrever
do que usar a forma culta. Disso também reclamam.)
Se não atende
a imprensa, "está no castelo" e "ignora o povo";
"não
dá satisfações", "é elite" nefelibata.
Mas se
atende, explica, conversa, então ouve:
“Popstar”,
“volte pros autos”, “seja um bom juiz, cala-te”...
ou...
“quer ser senador” ou “quer ser presidente”, “quer aparecer”.
Enfim,
proteja-se:
nem dê
entrevistas,
nem as
recuse.
Como?
(Ora, você não é um deus?)
Eis nosso
sacerdócio: fique em silêncio e
tenha o
dom da ubiquidade.
Põe terno,
é engravatado; mas se o tira, reclamam.
Você
solta, reclamam. Prende, reclamam.
Segue as
leis, é “legalista”, e reclamam;
mas se
segue princípios da CF, é “ativista”...
e reclamam.
Desde o
tempo na advocacia me ensinaram:
“Réu
inocente, ataque as provas; réu culpado, ataque o juiz...”
Então o
atacam, e ainda reclamam.
Garante a
lei para todos, mesmo os ricos, é porque é elite...
Mas se
decide pelo pobre, continua sendo “elite”.
Nunca
aceitam tirar essa pecha, nunca olham de onde veio a maioria dos juízes.
Na pior
das hipóteses, classe média.
Mas chamar
de “elite” é mais chique. Sempre.
Não se
mete na Administração, é fraco e tíbio,
mas se faz
alguma coisa, é “judicialização” da saúde e da política.
Você não
acha que tem que decidir quem deve ser operado primeiro; isso é coisa de
médico,
mas todos
os dias tem que garantir leito, remédio, internação e cirurgia.
Cadê a
£@&€£¥•# do Ministério da Saúde? Cadê o governo?
Você não
quer decidir isso, mas juiz tem que decidir, não?
Se nega a
internação, remédio ou cirurgia, é insensível e dorme achando que matou uma
pessoa; mas se conceder a tutela, é você o culpado por “quebrar” o orçamento.
Quando
você não decide é moroso, lento, omisso.
Mas se
decidir, é apressado e “decidiu errado, seu arbitrário”.
Quem perde
nos chama de burro ou comprado,
quem
ganhou de demorado.
Se não
combater a escancarada corrupção a todos notória,
é vendido,
cúmplice, bandido.
Mas se
prende, é cúmplice do outro partido, ou arbitrário.
Você,
candidato ao concurso para o cargo, saiba:
sempre
será burro, lento ou rápido demais, ou bandido.
E elite,
claro!
Aprenda a
lidar com isto.
Quanto
mais combate o crime,
mais
cortam seus reajustes, orçamento e meios.
E falam
mal de você;
sempre a
honestíssima crítica, a honestíssima mídia.
Aos
candidatos ao cargo, logo aviso:
não se
ataca os corruptos impunemente.
Se você
não recebe data-base, se calam.
Se
contribui 14% do bruto, se calam.
Se recebe
menos do que outras categorias, se calam.
Se passa
sete anos com o mesmo contracheque, se calam.
(você é
elite, você é elite!)
Reclamam
do AM, mas só do AM dos juízes.
Parlamentar,
pode; Poder Executivo, pode também.
Juiz, não
(só para juízes é que é imoral, entenda).
Se exerce
sua autoridade, é tirano;
se não a
exerce, é um banana.
É honesto
e trabalha, mas não adianta: vivem enchendo sua paciência citando a meia dúzia
que nos envergonha.
Não
concorda com a aposentadoria compulsória que não vira perda de cargo, mas não
adianta: você trabalha e ainda assim reclamam.
Todos
querem que haja juízes em Berlim,
mas ninguém
respeita os juízes de Berlim.
Quanto
mais omisso, mais paz; reclamar sempre reclamam.
Aos
candidatos advirto: que seus travesseiros não reclamem.
Sobre as
demais vozes, alerto:
Decidiu a
favor, você é justo;
decidiu
contra, você é burro ou bandido.
Não conte
com o STF, nem com o CNJ:
eles
garantem lhe vigiar,
mas não
garantem suas prerrogativas
nem os
meios para bem trabalhar.
Não vá se
preocupar com a LOMAN,
nem com o
art. 37, X, da CF.
Não conte
com eles.
Azar dos
juízes que precisam contar com políticos
ou
tribunais políticos,
e sorte
dos políticos que podem legislar o que bem entenderem sobre os juízes.
A cúpula
dos 3 Poderes dará suas soluções, mas esqueça a independência e a autonomia.
Contente-se com a harmonia dos Poderes. Eles sempre serão muito harmônicos
mesmo que isso signifique ignorar a situação dos juízes (os "de
piso", claro).
Nunca se
esqueça:
abuso de
autoridade é coisa só para juiz, promotor e polícia.
Parlamentar,
jamais;
governante
que nega remédio, previdência e escola, jamais;
parlamentar
e governante que vendem decisão, jamais.
Mas há
como jamais ser punido: basta deixar tudo como está.
Vão lhe
chamar de omisso, de elite, mas não vai rolar crime, nem denúncia na ONU, Haia
ou para o Papa. Nem campanha na mídia para dizer que seu tio usa meias
coloridas. Há como se proteger:
Cale-se
juiz; cale-se MPF; cale-se, Federal.
(Aos
Policiais Federais, um aviso: acordem 8 da manhã e jamais terão negados os seus
reajustes e orçamento, vocês ganharão viaturas novinhas para ficarem paradas no
pátio. Não mexam com os poderosos, não apareçam às 6 da manhã na mansão de
algum corrupto... e tudo ficará tranquilo!)
Falando em
concursos, se for fazer mestrado vão lhe discriminar.
Você não
tem tempo para só que pesquisar, escrever e coisas assim. Querem dedicação e
tempo exclusivo... entenda.
Nada de
operar o paciente. Nada de se misturar com a patuleia:
apenas
fale dela, defenda-a com discursos, não com liminares.
Se for
para o pós-doc, ou mesmo antes, lembre-se: suas decisões existem para serem
criticadas por quem não tem que resolver os problemas reais das vidas das
pessoas.
Todas as
suas liminares serão usadas contra você em juízo popular e de imprensa.
Ser juiz é
aprender que deve fazer justiça para os outros,
mas jamais
pedi-la.
“Justiça”
é termo que não lhe cabe... elite, elite, elite.
Afinal, se
você é juiz, usa a CF e acessa o Judiciário...
(A) se
perder, é burro, pediu o que não podia;
(B) se
ganhar, é bandido, assim como seu “cúmplice” que lhe deu o seu direito.
Não se
meta com nomeações, deixe que o Rei decida
(obstrução
de Justiça, cigarro, trabalho escravo ou malas e cuecas recheadas não são
assunto seu!).
E deixe
que fraudem as cotas, e que condenados fiquem soltos.
Melhor,
nem condene: ricos são perseguidos; pobres, oprimidos.
Ninguém
deve ser punido. Isso é coisa de burguês capitalista, de insensível social:
solte todos, ou nem prenda.
Meta-se o
menos possível. Proteja-se.
Tudo que
fizer será um grande abuso.
Eis uma
solução:
seja um
abajur na vetusta decoração da República,
não um
agente de transformação (isso é muito antipático).
O
imperador, a mídia e os condenados não gostam de juízes em Berlim. Aprenda.
Vá para o
MPF: paga mais, aporrinha menos (só não se meta a combater a corrupção. Ali, ou
na Polícia Federal, prometo: combata a improbidade e também será maltratado).
Vá para a
consultoria jurídica do Senado, ou opte por ser Notário! São nobres funções, e
necessárias, pagam mais e ninguém o aporrinha.
Pense bem
antes de querer ser juiz, pense.
É preciso
querer muito ser juiz, ou não compensa.
Aliás,
acho que raramente compensa.
Reflita:
há cargos que pagam mais e doem menos.
Bons
cargos, vá para um deles! Alguns recebem honorários, outros AM, olhe!
Após 30
anos de formado, 25 de magistrado, eu alerto:
pense bem,
candidato ao cargo,
reflita
muito. Você, sendo juiz, é culpado.
Pense,
repito, pense bem: há outros cargos.
Mas, se
for mesmo ser juiz, lembre-se de Caio Fernando Abreu:
“(...) tem
o seguinte, meus senhores: não vamos enlouquecer, nem nos matar, nem desistir.
Pelo contrário: vamos ficar ótimos e incomodar bastante ainda.”
__
William
Douglas, juiz.