A CHEGADA DE
ARIANO SUASSUNA NO CÉU
Autores:
Klévisson Viana e Bule-Bule
(Todos os
direitos reservados)
Nos palcos do
firmamento
Jesus concebeu
um plano
De montar um
espetáculo
Para Deus Pai
Soberano
E, ao lembrar
de um dramaturgo,
Mandou buscar
Ariano.
Jesus
mandou-lhe um convite,
Mas Ariano não
leu.
Estava noutro
idioma,
Ele num canto
esqueceu,
Nem sequer
observou
Quem foi que
lhe escreveu.
Depois de um
tempo, mandou
Uma segunda
missiva.
A secretária
do artista
Logo a dita
carta arquiva,
Dizendo: —
Viagem longa
A meu mestre
não cativa.
Jesus sem ter
a resposta
Disse torcendo
o bigode:
— Eu vejo que
Suassuna
É teimoso
igual a um bode.
Não pode, mas
ele pensa
Que é soberano
e pode!
Jesus, já
perdendo a calma,
Apelou pra
outro suporte.
Para cumprir a
missão,
Autorizou Dona
Morte:
— Vá buscar o
escritor,
Mas vê se não
erra o corte!
A morte veio
ao País
Como turista
estrangeiro,
Achando que o
Brasil
Era só Rio de
Janeiro.
No rastro de
Suassuna,
Sobrou pra
Ubaldo Ribeiro.
Porém, antes
de encontrá-lo,
Sofreu um
constrangimento
Passando em
Copacabana,
Um malfazejo
elemento
Assaltou ela
levando
Sua foice e
documento.
A morte ficou
sem rumo
E murmurou
dessa vez:
— Pra não
perder a viagem
Vou vender meu
picinez
Para comprar
outra foice
Na loja de
algum chinês.
Por um e
noventa e nove
A dita foice
comprou.
Passando a mão
pelo aço,
Viu que ela
enferrujou
E disse: — Vai
essa mesma,
Pois comprar
outra eu não vou!
A morte saiu
bolando,
Sem direção e
sem tino,
Perguntando a
um e a outro
Pelo escritor
nordestino,
Obteve
informação,
Gratificando
um menino.
Ao encontrar
João Ubaldo,
Viu naufragar
o seu plano,
Se lembrando
da imagem
Disse: — Aqui
há um engano.
Perguntou para
João
Onde é que
estava Ariano.
Nessa hora
João Ubaldo,
Quase ficando
maluco,
Tomou um susto
arretado,
Quando ali
tocou um cuco,
Mas,
gaguejando, falou:
—Ele mora em
Pernambuco!
A morte disse:
— Danou-se
Dinheiro não
tenho mais
Para viajar
tão longe,
Mas Ariano é
sagaz.
Escapou mais
uma vez,
Vai você
mesmo, rapaz!
Quando chegou
lá no Céu
Com o escritor
baiano,
Cristo lhe deu
uma bronca:
— Já foi
baldado o meu plano.
Pedi um da
Paraíba
E você trouxe
um baiano.
João Ubaldo é
talentoso,
Porém não
escreve tudo.
“Viva o Povo
Brasileiro”
É sua obra de
estudo,
Mas quero peça
de humor,
Que o Céu tá
muito sisudo.
Foi consultar
os arquivos
Pra
ressuscitar João,
Mas achou
desnecessário,
Pois já era
ocasião
Pra ele vir
prestar contas
Ali na Santa
Mansão.
Jesus olhou
para a Morte
E disse assim:
— Serafina,
Vejo não és
mais a mesma.
Tu já foste
mais malina,
Tá com pena ou
tá com medo,
Responda logo,
menina?!
— Jesus, eu
vou lhe falar
Que preciso de
dinheiro.
Ariano mora
bem
No Nordeste
brasileiro.
Disse o
Cristo: —Tenho pressa,
Passe lá no
financeiro!
— Só faço que
é pra o Senhor.
Pra outro,
juro não ia.
Ele que se
conformasse
Com o escritor
da Bahia.
Se dependesse
de mim,
Ariano não
morria.
A morte na
internet
Comprou
passagem barata.
Quase morria
de susto
Naquela viagem
ingrata.
De vez em
quando dizia:
— Eita que
viagem chata!
Uma aeromoça
lhe trouxe
Duas barras de
cereais.
Diz ela: —
Estou de regime.
Por favor, não
traga mais,
Porque se vier
eu como,
Meu apetite é
voraz!
Quando chegou
no Recife,
Ficou ela de
plantão
Na porta de
Ariano
Com sua foice
na mão,
Resmungando: —
Qualquer hora
Ele cai no
alçapão!
A morte
colonizada,
Pensando em
lhe agradar,
Uma faixa com
uma frase
Ela mandou
preparar,
Dizendo:
“Welcome Ariano”,
Mas ele não
quis entrar.
Vendo a tal
faixa, Ariano
Ficou muito
revoltado.
Começou a
passar mal,
Pediu pra ser
internado
E a morte foi
lhe seguindo
Para ver o
resultado.
Eu não sei se
Ariano
Morreu de
raiva ou de medo.
Que era contra
estrangeirismos,
Isso nunca foi
segredo.
Certo é que a
morte o matou
Sem lhe tocar
com um dedo.
Chegou no Céu
Ariano,
Tava a porta
escancarada.
São Pedro
quando o avistou
Resmungando na
calçada,
Correu logo
pra o portão,
Louvando a sua
chegada.
Um anjinho de
recado
Foi chamar o
Soberano,
Dizendo: - O
Senhor agora
Vai
concretizar seu plano.
São Pedro
mandou dizer
Que aqui
chegou Ariano.
Jesus saiu
apressado,
Apertando o nó
da manta
E disse assim:
— Vou lembrar
Dessa data
como santa
Que a arte de
Ariano
Em toda parte
ela encanta.
São Pedro lá
no portão
Recebeu bem
Ariano,
Que chegou
meio areado,
Meio confuso e
sem plano.
Ao perceber
que morreu,
Se valeu do
Soberano.
Com um
chapelão de palha
Chegou Ascenso
Ferreira,
O grande
Câmara Cascudo,
Zé Pacheco e
Zé Limeira.
João Firmino
Cabral
Veio engrossar
a fileira.
E o próprio
João Ubaldo
(Que foi pra
lá por engano)
Veio de braços
abertos
Para abraçar
Ariano.
E esse falou:
- Ubaldo,
Morrer não
tava em meu plano!
Logo chegou
Jorge Amado
E o ator Paulo
Goulart.
Veio também
Chico Anysio
Que começou a
contar
Uma anedota
engraçada
Descontraindo
o lugar.
Logo chegou
Jesus Cristo,
Com seu rosto
bronzeado.
Veio de braços
abertos,
Suassuna
emocionado
Disse assim: —
Esse é o Mestre,
O resto é papo
furado!
Suassuna que,
na vida,
Sonhou em ser
imortal,
Entrou para
Academia,
Mas percebeu,
afinal,
Que imortal é
a vida
No plano
celestial.
Jesus explicou
seus planos
De fazer uma
companhia
De teatro e
ele era
O escritor que
queria
Para escrever
suas peças,
Enchendo o Céu
de alegria.
Nisso Ariano
responde:
— Senhor, eu
me sinto honrado,
Porém escrever
uma obra
É serviço
demorado.
Às vezes gasto
dez anos
Para obter
resultado.
Nisso Jesus
gargalhou
E disse: —
Fique à vontade.
Tempo aqui não
é problema,
Estamos na
eternidade
E você pode
criar
Na maior
tranquilidade.
Um homem bem
pequenino
Com
chapeuzinho banzeiro,
Com um singelo
instrumento,
Tocou um coco
ligeiro
Falando da
Paraíba:
Era Jackson do
Pandeiro.
Logo chegou
Luiz Gonzaga,
Lindu do Trio
Nordestino,
E apontou
Dominguinhos
Junto a José
Clementino
E o grande
Humberto Teixeira,
Raul e Zé
Marcolino.
Depois chegou
Marinês
Com Abdias de
lado
E Waldick
Soriano,
Com um
vozeirão impostado,
Cantou
“Torturas de Amor”,
Como sempre
apaixonado.
Veio então
Silvio Romero
Com Catulo da
Paixão,
Suassuna
enxugou
As lágrimas de
emoção
E Catulo, com
seu pinho,
Cantou “Luar
do Sertão”.
Leandro Gomes
de Barros
Junto a
Leonardo Mota,
Chegou Juvenal
Galeno,
Otacílio
Patriota.
Até Rui
Barbosa veio
Com título de
poliglota.
Chegou Regina
Dourado,
Tocada de
emoção,
Juntinho de
Ariano,
Veio e beijou
sua mão
E disse: — Na
sua peça
Quero
participação.
Ariano
dedicou-se
Àquele projeto
novo.
Ao concluir
sua peça,
Jesus deu o
seu aprovo
E a peça foi
encenada
Finalmente
para o povo.
Na peça de
Ariano
Só participa
alma pura.
Ariano virou
santo,
Corrigiu sua
postura.
Lá no Céu
ganhou o título
Padroeiro da
cultura.
Os artistas
que por ele
Já nutriam
grande encanto
Agora estando
em apuros,
Residindo em
qualquer canto,
Lembra de
Santo Ariano
E acende vela
pro santo.
Ariano foi
Quixote
Que lutou de
alma pura.
Contra a arte
descartável
Vestiu a sua
armadura
Em qualquer
dia do ano
Eu digo: viva
Ariano
Padroeiro da
Cultura!
FIM
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