O Grupo de Pesquisa Trabalho, Constituição e Cidadania (UnB/CNPq)
vem manifestar sua posição em relação ao Projeto de Lei nº 4330/2004, que teve
seu texto base aprovado na Câmara dos Deputados, em 8 de abril de 2015. Nós,
pesquisadores do mundo do trabalho, defendemos a rejeição do referido projeto
de lei, pelos motivos que passamos a expor:
1. O projeto de lei, a despeito de se
definir regulamentador da terceirização de serviços, ao permitir a
terceirização do “conjunto das atividades empresariais”, em verdade legitima a
intermediação de mão de obra no ordenamento jurídico brasileiro, em detrimento
das garantias constitucionais vinculadas ao direito fundamental à relação de
emprego e ao sistema constitucional do emprego socialmente protegido.
2. O projeto, ao institucionalizar a
terceirização indiscriminada de atividade fim, admite que entre o trabalhador e
o seu real empregador figure uma empresa intermediária que, independentemente
da especialização, atua como agenciadora de trabalho humano, oferecendo-o como
mercadoria. Permite-se, dessa forma, o surgimento de empresas vazias, ou seja,
desprovidas de empregados diretamente contratados, como, por exemplo, uma
escola sem professores ou um hospital sem médicos.
3. O projeto de lei pretende
instrumentalizar o trabalho humano, ao permitir a conversão do sujeito
trabalhador em objeto de negociação entre empresas, prejudicando sua condição
de destinatário de direitos fundamentais preconizados na Constituição Federal e
no Direito Internacional dos Direitos Humanos.
4. A análise científica do fenômeno
da terceirização e de sua regulação jurídica demonstra que esse mecanismo tem
sido responsável pelo decréscimo dos patamares jurídicos da afirmação de
direitos individuais e coletivos dos trabalhadores. As pesquisas mais recentes
apontam, por exemplo:
a) a incidência de acidentes de trabalho
graves e fatais, bem como de doenças ocupacionais, é infinitamente maior entre
terceirizados;
b) o número de trabalhadores resgatados
em situações análogas à de escravo é na sua quase totalidade de terceirizados;
c) a permanência no emprego do
trabalhador terceirizado é inferior a do trabalhador diretamente contratado;
d) a rotatividade entre os trabalhadores
terceirizados é superior a dos trabalhadores diretamente contratados;
e) o índice de inadimplência de verbas
trabalhistas é superior nas empresas terceirizadas;
f) a remuneração dos trabalhadores
terceirizados é significativamente inferior a dos empregados diretos da empresa
tomadora de serviços;
g) a duração semanal do trabalho
terceirizado é superior a do trabalhador diretamente contratado.
5. A terceirização ainda dificulta a
constituição e o funcionamento da organização sindical, assegurados
constitucionalmente, na medida em que inviabiliza a reunião dos trabalhadores
terceirizados em torno do sindicato legitimado para a defesa dos seus reais
interesses, frustrando as relações de cooperação e de solidariedade e a própria
identidade de classe. Dessa forma, provoca grave déficit de efetividade do
direito fundamental à liberdade sindical e à negociação coletiva.
Particularmente no tocante à
aprovação do Projeto de Lei nº 4.330, o Grupo
de Pesquisa Trabalho, Constituição e Cidadania
destaca quatro pontos críticos das emendas aglutinativas do processo
legislativo e propõe sugestões para minimizar os efeitos deletérios de seu
texto base, reforçando o compromisso do Estado brasileiro em promover a
inclusão socioeconômica protegida do trabalhador:
a) ATIVIDADE
FIM: Entendemos que a terceirização em atividade fim é
terminante e constitucionalmente proibida tanto para o segmento público quanto
para a iniciativa privada, sem exceções. A inconstitucionalidade da prática da
terceirização na atividade fim do empreendimento se justifica pela violação ao
regime constitucional do emprego socialmente protegido e por afronta à função
social da empresa.
b) RESPONSABILIDADE
PELAS OBRIGAÇÕES TRABALHISTAS E SOCIAIS:
Entendemos que a responsabilidade pelas obrigações trabalhistas e sociais dos
trabalhadores terceirizados deve ser solidária entre a empresa tomadora e a
empresa prestadora de serviços, tanto para ampliar a garantia do pagamento do
crédito trabalhista quanto para evitar a transferência do risco econômico ao
trabalhador.
c) IGUALDADE
SALARIAL: Entendemos que trabalhadores terceirizados têm
direito à igualdade salarial em relação aos trabalhadores contratados
diretamente pela empresa tomadora de serviços, em vista do princípio
constitucional da isonomia, nos termos do Direito do Trabalho brasileiro.
d) ENQUADRAMENTO
SINDICAL: Entendemos que a entidade sindical dos
trabalhadores da empresa tomadora de serviços apresenta-se como a organização
sindical efetivamente representativa dos direitos e interesses dos
trabalhadores terceirizados, qualquer que seja a atividade empresarial, por ser
nela que os trabalhadores verdadeiramente se integram em seu cotidiano de
labor.
Encaminhamos esta Carta Aberta à
Câmara dos Deputados, no sentido de densificar o debate sobre a normatização da
terceirização trabalhista, fundados na perspectiva democrática do processo
legislativo brasileiro.
Brasília, 20 de Abril de 2015.
Grupo de Pesquisa Trabalho, Constituição e Cidadania –
Faculdade de Direito da Universidade de Brasília - UnB."
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