Publicado na Folha de São Paulo
JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
E a casa ficou grande
SÃO PAULO - A professora de direito do trabalho
explica que o Congresso foi populista e que a relação entre patrão e empregada
doméstica tem que ser diferente das demais. A lógica é que o lucro, a
mais-valia marxista, inexiste como objetivo em tal relação. Assim, por
natureza, precisa ser regida de outra forma.
Mas, se não há lucro nessa relação, por que investimos nisso? Por que
doamos parte do salário, uma fração da casa e, vá lá, aquele cozido que sobrou,
muito bom, mas que ninguém vai comer? Provavelmente porque não queremos limpar
o banheiro, porque alguém precisa ficar com as crianças, porque fizemos a conta
e, dada a diferença entre o que ganhamos por uma hora de trabalho versus o que
pagamos para elas pela mesma hora, vale a pena. Não há lucro?
Se há, ele está minguando no bolso da classe média, a original, não a
que se forma à força com crédito e consumo neste momento. Essa estreita faixa
de gente, mais educada e esclarecida, sempre ansiou por um país mais justo,
moderno e melhor. Esse dia chegou, só que de maneira bem diversa da imaginada.
Antes sozinha no elevador e capaz de, com alguma sorte, alcançar o botão
do andar de cima, a classe média se viu de repente cercada de gente na cabine.
Sem forças para atravessar a multidão e descer no andar desejado. Às vezes com
chance de descer apenas no de baixo.
O Brasil atual é especialmente cruel para essa turma. O aclamado pleno
emprego é uma ameaça, as linhas de financiamento não se encaixam, o dinheiro no
banco vira pó. E, cada vez mais distante do antes visível mundo dos ricos, que
agora prefere "mirar" a classe C, vê-se imaginando como será viver
nesse universo que causa ojeriza. Que lota aeroportos e hospitais privados
antes vazios, que tem crédito para comprar carro e não sabe dirigir, que tem
cota na universidade. Que vota.
Acostume-se. Invista no detergente mais caro, que não estraga as mãos.
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