em Natividade, havia um temido proprietário de oficina mecânica; conhecido
nas redondezas por tratar seus empregados com excessivo rigor; aqui as notícias
correm; é inevitável tomar conhecimento desses boatos; tem que estar preparado
para ouvir e filtrar ou esquecer (se é que isso é possível); recebemos uma
reclamação trabalhista e agendamos audiência para a viagem seguinte; neste
intervalo, a oficiala de justiça tentou por diversas vezes notificar o tal dono
da mecânica, mas ele ofereceu resistência das mais diversas formas; numa delas,
curiosa por sinal, pulou o muro e saiu correndo para não receber o mandado; a
oficiala era muito firme, como tem que ser quem exerce este ofício; o trabalho
dela me impressionava; ela agia igual um detetive; não sossegava enquanto não
cumpria a ordem; nunca recebi uma certidão negativa dela; hoje ela está em
Brasília; é uma excelente profissional; mas voltando ao assunto; ela conseguiu
cumprir o mandado, embora o dono da mecânica tenha esbravejado de que não tinha
juiz neste mundo que fizesse ele pagar direitos àquele trabalhador (aqui omito
o palavrão que ele soltou na ocasião, mas que fazia referência à mãe do
infeliz); foram três audiências neste processo; encontros difíceis; nenhum dos
lados estava assistido por advogado; o dono da mecânica se apresentou com uma
educação ímpar; dirigia-se a mim com um português polido; tratava-me como manda
o figurino; “excelência”; “meritíssimo”; o trabalhador ficava com a cabeça
baixa e às vezes esboçava um sorriso irônico em direção ao desafeto; num dado
momento, o trabalhador olhou para mim e disse: “dotô, esse moço falou que num
tem juiz nesse mundo que faça ele me pagar”; a informação realmente batia com
as dificuldades da oficiala de justiça; olhei para o reclamante e respondi;
“não meu caro senhor, com certeza ela não diria uma coisa dessas; ele me parece
ser uma pessoa muito esclarecida, não é mesmo seu fulano? ele sabe que se for
reconhecido que ele deve, ele pagará”; o reclamado exclamou, “sim, excelência,
quem sou eu para descumprir uma ordem da justiça”; ouvimos as testemunhas dos
dois lados; proferi a sentença; resultado procedente em parte; pelo meu
julgamento, ninguém estava totalmente certo e ninguém estava totalmente errado;
aquela tentativa salomônica de dividir o perseguido ideal do justo; mas ele
pagou o que devia; do lado de fora do foro, todos aguardavam a saída do juiz;
nesta hora temos que ser bem cautelosos; não há muita segurança na região; não
há reforço policial suficiente; mas, para minha surpresa, todos queriam era apertar
a mão do juiz e falar alguma coisa; contar histórias; convidar para um almoço;
eu declinava os convites com um sorriso estampado no rosto, mas ouvia tudo o
que falavam com atenção; isso já era suficiente para deixá-los satisfeitos;
criou-se um ritual; todas as vezes que faço audiência em Natividade, fica uma
romaria na frente do foro para conversar comigo; nessa hora fico sem saber o
que sou realmente; juiz? padre? pastor? pai de santo? vidente? recordava-me
então das lições de um desembargador aposentado que sempre me alertou: “a
magistratura é um ato de amor”; e não é que ali isso fazia todo o sentido?
quinta-feira, 31 de outubro de 2013
quinta-feira, 24 de outubro de 2013
LOUCOS DE TODO GÊNERO - NARRATIVAS DE UM JUÍZO ITINERANTE Por MÁRCIO ROBERTO ANDRADE BRITO Juiz do Trabalho
LOUCOS DE TODO GÊNERO
desenho de Ailly |
certo dia adentrou na sala de audiência um reclamante que demonstrava
absoluta dificuldade para se comunicar; apresentava sinais claros de confusão
mental; sua reclamação trabalhista havia sido reduzida a termo pela secretaria da
vara (atermação); os servidores já alertaram ao juiz de que o reclamante
transparecia não estar em pleno gozo de suas faculdades mentais; o diálogo em
audiência foi muito difícil; o ex-empregador não demonstrava nenhuma surpresa;
ao contrário, sorria a cada palavra do reclamante, mas não em tom de deboche;
olhava para o juiz como querendo dizer que o reclamante era “daquele jeito
mesmo”; a cidade o conhecia assim; na narrativa dos fatos, o reclamante havia
se comprometido a realizar alguns serviços na fazenda do reclamado por
empreitada e agora cobrava valores que o reclamado sustentava ter pagado; a
indignação do reclamante residia no fato de acreditar que seu trabalho valia
mais do que o acertado, do que o combinado, do que o pago; estava nítido que
ele recebera o valor prometido; mesmo assim o reclamado propôs pagar R$ 300,00
para encerrar o processo; não houve acordo; marcamos audiência de instrução; e
convoquei o MPT (Ministério Público do Trabalho); a audiência itinerante foi
inusitada; por mais que a procuradora do trabalho tentasse convencer o
reclamante de que deveria receber o valor proposto, pois a obrigação do
empregador já havia sido totalmente cumprida, o reclamante não aceitava; dizia
em alto e bom som que a procuradora e o juiz tinham sido “comprados” pelo outro
lado; perguntava com ingenuidade e uma sinceridade dilacerante à procuradora se
ela estava ali para defender ele ou o reclamado; a situação era constrangedora
e ao mesmo tempo hilária; a audiência estava sendo filmada pela TV Justiça que
realizava um documentário sobre justiça itinerante no Tocantins; não havia nenhum
indício de afronta à autoridade, apenas uma ignorância velada pela notória
confusão mental do reclamante que não possuía nenhum familiar vivo para lhe
orientar; vivia na cidade à própria sorte; seria uma crueldade propor a sua
interdição; privaríamos o ser de viver seu estado de loucura com liberdade? não
aceitou o acordo e o processo foi julgado improcedente; a cena fez brotar em
mim uma profunda reflexão sobre o ato de decidir; a função do Estado; as
imagens construídas pelo senso comum sobre corrupção no sistema judiciário; a
problemática educacional no interior do país; o tratamento do Estado frente à
saúde mental da população; e uma única certeza: há loucos de todo gênero;
segunda-feira, 21 de outubro de 2013
DIREITOS SOCIAIS E RETROCESSO: O CASO DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE DOS TRABALHADORES DO SETOR ELÉTRICO - Artigo de autoria do Desembargador do TRT 10ª Região, DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES
O Desembargador Douglas Alencar Rodrigues, da 10ª Região,
vem escrevendo artigos sobre temas jurídicos de relevante importância para
reflexões daqueles que trabalham com o direito. O artigo "DIREITOS SOCIAIS
E RETROCESSO: O CASO DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE DOS TRABALHADORES DO SETOR
ELÉTRICO" propõe reflexões sobre a base de cálculo do adicional de
periculosidade devido aos trabalhadores do setor elétrico, após o advento da
Lei 12.740, de 8 de dezembro de 2012, que revogou integralmente a Lei 7.369/85.
Em síntese, examina se é possível adotar a base de cálculo do referido
adicional prevista para os trabalhadores em geral, considerada a proibição
constitucional de retrocesso no campo dos direitos sociais.
O artigo já foi publicado no CONJUR e no Correio Braziliense,
Caderno Direito e justiça|CB do dia 7.10.2013
http://www.conjur.com.br/2013-out-04/douglas-alencar-lei-omite-base-calculo-adicional-periculosidade
DIREITOS SOCIAIS E RETROCESSO: O
CASO DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE DOS TRABALHADORES DO SETOR ELÉTRICO
Douglas Alencar Rodrigues
A Lei 7.369/85 dispôs sobre o
direito ao adicional de periculosidade para os trabalhadores do setor elétrico,
estabelecendo que o percentual correspondente incidiria sobre o salário do
empregado, ou seja, com a consideração de todos os componentes de natureza
salarial pagos ao trabalhador. Essa disposição acabou aclarada pela Súmula 191
do Tribunal Superior do Trabalho, implicando a concessão de vantagem expressiva
ao conjunto de trabalhadores que laboravam em condições de risco acentuado pela
exposição permanente à energia elétrica.
Com o advento da recente Lei
12.740, em 8 de dezembro de 2012, foi determinada a inscrição na CLT do direito
ao adicional pelo risco causado pela energia elétrica, com a consequente
revogação integral da Lei 7.369/85. Embora com propósito aparente de unificar
os diplomas normativos, a nova lei silenciou acerca da base de cálculo do
adicional, sugerindo que a vantagem deve se sujeitar ao critério de apuração do
salário base, excluídas quaisquer outras vantagens (CLT, art. 457).
Esse nova realidade normativa
silêncio tem suscitado novos debates: seria constitucional a inovação legal em
questão, sob a perspectiva do retrocesso provocado na regulação de direito
previsto no Texto Maior (CF, art. 7º, XXIII)? Essa inovação legal, com sentido
restritivo, seria aplicável aos contratos vigentes antes de seu advento?
Para responder a esses
questionamentos, é preciso recordar, antes, que a diretriz axiológica no campo
dos direitos sociais está vinculada ao norte da melhoria da condição social do
trabalhador (CF, art. 7º, “caput”), disso resultando a ineficácia das inovações
legais ou contratuais que consagrem retrocessos à margem das hipóteses pontuais
e excepcionais previstas na própria Carta Magna e que estão circunscritas ao poder
negocial coletivo (CF, art. 7º, VI, XIII e XIV).
De acordo com a história
evolutiva dos direitos humanos, que se confunde com o próprio tratamento
dispensado pelas sociedades ocidentais ao postulado da dignidade humana, os
direitos sociais trabalhistas, inscritos na segunda dimensão dos direitos
humanos, estão gravados com a nota da denominada “dupla dimensão, objetiva e
subjetiva”, que representa um dos principais avanços da teoria constitucional
contemporânea.
Sob essa perspectiva, e para além
da constatação de que os direitos humanos, em todas as suas dimensões ou
gerações, buscam assegurar os ideais da liberdade e da igualdade, valorizando a
dignidade da pessoa humana de forma ideal e abrangente, a dogmática
constitucional evoluiu para reconhecer, ao lado dos efeitos subjetivos, que
conferem aos cidadãos pretensões exercitáveis perante o Estado e particulares,
a perspectiva objetiva dos direitos humanos, segundo a qual devem ser
compreendidos como “decisões valorativas de natureza jurídico-objetiva da
Constituição, com eficácia em todo o ordenamento jurídico e que fornecem
diretrizes para os órgãos legislativos, judiciários e executivos.”[1]
Além disso, a partir do instante
em que são positivados por ordens jurídicas constitucionais, os direitos
humanos acabam revestindo a nota da fundamentalidade formal, da qual derivam
consequências relevantes, entre as quais, na dicção do Professor Canotilho, a
de que passam a constituir parâmetros materiais de escolhas, decisões e ações e
controle dos órgãos legislativos, administrativos e jurisdicionais[2]
Em outras palavras, representam
os direitos humanos um conjunto de “valores objetivos básicos” que vinculam e
condicionam a ação dos poderes públicos, e não apenas traduzem garantias
direcionadas à tutela de interesses individuais. Normas definidoras de direitos
fundamentais assumem, nesse contexto, “eficácia dirigente” em relação às ações
dos poderes públicos, representando, mesmo quando apresentem conteúdo meramente
programático, limites materiais negativos para a ação conformadora a cargo dos
poderes públicos.
Dessa dimensão objetiva dos
direitos fundamentais advém a noção de que tais direitos, enquanto conjunto de
valores comunitários, devem ser interpretados não apenas sob a perspectiva do
indivíduo, mas também de toda a comunidade, na medida em que representam
valores e fins agasalhados por ela, que devem ser respeitados e realizados.
Os direitos fundamentais postos
na Constituição, enquanto conjunto de valores expressos em normas jurídicas,
igualmente representam parâmetros de valoração das leis e demais atos
normativos editados pelo Estado, inclusive sob o prisma de sua própria
constitucionalidade.
À luz dessas considerações, ganha
expressão a tese da inconstitucionalidade da Lei 12.740/2012, na medida em que,
ao revogar norma consagradora de critério benéfico e silenciar acerca da forma
de apuração da vantagem devida aos eletricitários, acabou impondo inescusável
retrocesso, contrariando o ideal de avanço e melhoria da condição social dos
trabalhadores, que vincula a ação estatal, em todas as suas esferas, no campo
dos direitos sociais trabalhistas (art. 7º, “caput”, da CF).
É preciso lembrar que “O
princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais
de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo
cidadão ou pela formação social em que ele vive.”[3]
Ainda que superado o debate sobre
a constitucionalidade da Lei 12.740/2012, não se pode concluir por sua
aplicabilidade aos contratos celebrados antes de seu advento. Afinal, no
instante em que é celebrada, a relação de emprego passa a se sujeitar ao
complexo de normas jurídicas então vigentes: normas legais imperativas - que
consagram parâmetros mínimos de proteção social (CLT, art. 9º c/c o art. 7º,
“caput”, da CF) e normas de origem autônoma produzidas pelos próprios atores sociais
- destinadas a ampliar os níveis de proteção já assegurados na legislação
estatal (art. 444 da CLT e art. 7º, XXVI, da CF).
Em outras palavras, os parâmetros
de proteção social em vigor no instante da contratação laboral configuram o
arcabouço normativo que regulará aquele negócio jurídico, ressalvadas, apenas,
insista-se, as alterações subsequentes vantajosas ao trabalhador ou ainda
aquelas que, embora prejudiciais, sejam fruto do processo negocial coletivo
ressalvado na própria Constituição da República (art. 7º, VI, XIII e XIV).
Alterações outras, que impliquem
redução dos parâmetros de proteção anteriormente estabelecidos, não podem
produzir efeitos sobre os vínculos jurídicos já celebrados, sob pena de
indisfarçável inconstitucionalidade (art. 7º, “caput”, da CF) ou mesmo
ilegalidade (CLT, art. 468), conforme a sua natureza e objeto. Não se mostra
lícito, pois, ao legislador impor redução salarial aos trabalhadores, por meio
de alteração legislativa, sob pena de afronta direta e literal ao inciso VI do
art. 7º da CF, como parece ser possível, a partir da Lei 12.740/2012.
Por imposição constitucional,
portanto, não pode o legislador reduzir ou suprimir os parâmetros de proteção
já alcançados, sob pena de produzir obra inconstitucional, cuja ineficácia deve
ser declarada pelos órgãos do Poder Judiciário.
[1] SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 7. ed. rev.
atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2007. p. 147
[2] CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito Constitucional e Teoria da
Constituição. Ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1997, p. 349.
sábado, 19 de outubro de 2013
CENTENÁRIO DE VÍNICIUS DE MORAES
Hoje, 19/10/2013, Vinicius de Moraes, completaria 100 anos. Nossas homenagens ao grande poeta brasileiro.
“A bênção, Senhora!
A maior ialorixá da Bahia
Terra de Caymmi e João Gilberto
A bênção, Pixinguinha
Tu que choraste na flauta todas as minhas mágoas de
amor
A bênção, Sinhô
Sua bênção, Cartola
A bênção, Ismael Silva
Sua bênção, Heitor dos Prazeres
A bênção, Nélson Cavaquinho
A bênção, Geraldo Pereira
A bênção, meu bom Cyro Monteiro
Você, sobrinho de Nono
A bênção, Noel
Sua bênção, Ary”
RECONHECIDA A ATIVIDADE DE VAQUEIRO COMO PROFISSÃO
Lei nº 12.870, de 15.10.2013 - DOU de 16.10.2013
Dispõe sobre o exercício da atividade profissional de vaqueiro.
A Presidenta da República
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte
Lei:
Art. 1º Fica reconhecida a atividade de vaqueiro como profissão.
Art. 2º Considera-se vaqueiro o profissional apto a realizar práticas
relacionadas ao trato, manejo e condução de espécies animais do tipo bovino,
bubalino, equino, muar, caprino e ovino.
Art. 3º Constituem atribuições do vaqueiro:
I - realizar tratos culturais em forrageiras, pastos e outras plantações
para ração animal;
II - alimentar os animais sob seus cuidados;
III - realizar ordenha;
IV - cuidar da saúde dos animais sob sua responsabilidade;
V - auxiliar nos cuidados necessários para a reprodução das espécies, sob a
orientação de veterinários e técnicos qualificados;
VI - treinar e preparar animais para eventos culturais e socioesportivos,
garantindo que não sejam submetidos a atos de violência;
VII - efetuar manutenção nas instalações dos animais sob seus
cuidados.
Art. 4º A contratação pelos serviços de vaqueiro é de responsabilidade do
administrador, proprietário ou não, do estabelecimento agropecuário de
exploração de animais de grande e médio porte, de pecuária de leite, de corte e
de criação.
Parágrafo único. (VETADO).
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 15 de outubro de 2013; 192º da Independência e 125º da
República.
DILMA ROUSSEFF
Guido Mantega
Antônio Andrade
Manoel Dias
Gilberto Carvalho
Razão de Veto à Lei 12.870
MENSAGEM Nº 457, DE 15 DE OUTUBRO DE 2013
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1º do art. 66 da
Constituição , decidi vetar parcialmente, por contrariedade ao interesse
público, o Projeto de Lei nº 83, de 2011 (nº 2.123/2007 na Câmara dos
Deputados), que "Dispõe sobre o exercício da atividade profissional de
vaqueiro".
Ouvidos, os Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e da
Fazenda manifestaram-se pelo veto ao seguinte dispositivo:
Parágrafo único do art. 4º
"Parágrafo único. O contrato de prestação de serviços ou de emprego a que
se refere o caput deste artigo preverá, obrigatoriamente, seguro de vida e de
acidentes em favor do vaqueiro, compreendendo indenizações por morte ou
invalidez permanente e ressarcimento de todas as despesas médicas e hospitalares
decorrentes de eventuais acidentes ou doenças profissionais que vier a sofrer no
interstício de sua jornada laboral, independentemente da duração da eventual
internação, dos medicamentos e das terapias que assim se fizerem
necessários."
Razões do veto
"Na forma como redigido, o dispositivo não leva adequadamente em
consideração a realidade econômica do setor, em especial a dos pequenos
produtores, onerando o processo produtivo excessivamente. Assim, a medida
poderia ter como efeito a redução da contratação de vaqueiros, enfraquecendo a
categoria e gerando desemprego. Além disso, ao limitar tais garantias a estes
profissionais, criaria diferenciações de tratamento em relação aos demais
trabalhadores rurais e outras categorias que atuam no setor
agropecuário."
Essas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar o dispositivo
acima mencionado do projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação
dos Senhores Membros do Congresso Nacional.
sexta-feira, 18 de outubro de 2013
TUTELAS DE URGÊNCIA E SUA IMPUGNABILIDADE NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO - DES. DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES
TUTELAS DE URGÊNCIA E SUA
IMPUGNABILIDADE NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO
Douglas Alencar Rodrigues, Magistrado em
Brasília-DF.
Na estruturação das normas
processuais trabalhistas, o legislador conferiu especial significado aos
princípios da celeridade e economia processuais, diante da natureza alimentar
dos créditos trabalhistas, que são essenciais à subsistência do trabalhador e
de sua família. Entre as muitas disposições legais voltadas a simplificar e
acelerar os procedimentos, o legislador consolidado consagrou a regra geral de
que as decisões interlocutórias não poderiam ser alvo de ataque recursal
imediato, embora pudessem ser objeto de reexame por ocasião do recurso cabível
contra as sentenças de mérito que viessem a ser proferidas[1].
Embora algumas ressalvas a esse
postulado tenham sido inscritas na própria legislação ou consagradas na via
jurisprudencial[2], a lógica da contenção
de recursos contra decisões interlocutórias tem possibilitado o trânsito
racional e regular das ações trabalhistas, sem qualquer prejuízo ao amplo
direito de defesa.
No âmbito das chamadas tutelas de
urgência, composto pelas decisões liminares e decisões de antecipação dos
efeitos da tutela, entretanto, o debate acerca da possibilidade de impugnação
imediata das decisões judiciais assumiu outro significado.
Nesse específico universo, em que
a tutela do direito lesado ou ameaçado reclama medidas rápidas, concretas e
efetivas, o controle imediato das decisões judiciais passou a ser admitido e
efetivado por meio do mandado de segurança, remédio constitucional que compõe a
chamada jurisdição constitucional das liberdades e que possibilita a
retificação de erros e decisões judiciais arbitrárias.
No exercício de sua função de
pacificar a interpretação do direito federal no âmbito dos órgãos da jurisdição
trabalhista, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 414, que foi
estruturada em três itens com os seguintes conteúdos: “I - A antecipação da
tutela concedida na sentença não comporta impugnação pela via do mandado de
segurança, por ser impugnável mediante recurso ordinário. A ação cautelar é o
meio próprio para se obter efeito suspensivo a recurso. II - No caso da tutela
antecipada (ou liminar) ser concedida antes da sentença, cabe a impetração do
mandado de segurança, em face da inexistência de recurso próprio. III - A
superveniência da sentença, nos autos originários, faz perder o objeto do
mandado de segurança que impugnava a concessão da tutela antecipada (ou
liminar).”
Com base no enunciado do item II
acima transcrito, parte da jurisprudência tem sustentado que as decisões que
denegam liminares ou pedidos de antecipação de tutela não ensejariam a
impetração do mandado de segurança, seja porque tal possibilidade foi restrita
às decisões concessivas, seja porque, de acordo com a diretriz posta na Súmula
418 daquele mesmo tribunal, “A concessão de liminar ou a homologação de
acordo constituem faculdade do juiz, inexistindo direito líquido e certo
tutelável pela via do mandado de segurança.”
Sem embargo das razões que tentam
explicar essa linha de compreensão, o equívoco intelectivo parece manifesto e o
resultado que produz contraria o próprio sentido da cláusula constitucional de
amplo acesso à Justiça. Afinal, de acordo com a legislação vigente, a
possibilidade de impugnação às decisões judiciais por via recursal ou autônoma
define-se em razão da natureza das decisões proferidas, e não do conteúdo que
possam assumir. Por isso, sendo irrecorríveis as interlocutórias trabalhistas
proferidas no âmbito das tutelas de urgência, a mera possibilidade de
configuração de erro ou de arbitrariedade judicial faz impositivo o cabimento
do mandado de segurança, única via cabível para reparar eventual lesão ou
ameaça a direito líquido e certo, que pode estar configurada no âmbito da
cognição cautelar ou antecipatória de efeitos da tutela.
Caso concreto recentemente
julgado no TRT da 10a Região bem permite ilustrar esse raciocínio.
Cuidava-se de um dirigente sindical cujo contrato de trabalho fora rescindido
sem a autorização constitutiva própria de inquérito judicial. Proposta a
reclamação com os pedidos de nulidade da dispensa e de reintegração ao emprego,
além do pagamento dos salários do período de afastamento, foi indeferida a
tutela antecipada em primeiro grau, sobrevindo, contra esta decisão, a
impetração de mandado de segurança pelo trabalhador vitimado. Concedida a
liminar pelo Relator, aviou a empresa agravo regimental, o qual restou provido
pelo órgão fracionário competente, com base na interpretação literal das
Súmulas 414 e 418 do TST.
Assim, o trabalhador que havia
sido reintegrado pela decisão liminar no mandado de segurança, foi, em seguida,
novamente dispensado em razão da decisão lavrada no agravo regimental. Pouco
tempo depois foi proferida sentença na reclamação trabalhista, deferindo o
julgador os direitos reclamados pelo trabalhador...
Nesse exemplo concreto, tivesse a
tutela sido concedida em primeiro grau, o mandado de segurança, segundo a tese
fundada na exegese literal das Súmulas 414 e 418, seria admitido sem qualquer
questionamento, não prevalecendo, curiosamente, a tese de que o deferimento de
liminar estaria inscrito no livre convencimento do magistrado, não violando
direito líquido e certo, na forma da Súmula 418 do TST.
O acesso amplo e igualitário à
Justiça representa uma das mais expressivas características do Estado
democrático contemporâneo. Muito além de representar a simples possibilidade de
recorrer ao Poder Judiciário para a defesa ou salvaguarda de direito ou
pretensão contra lesão ou ameaça, também alcança a possibilidade de obtenção de
decisões substancialmente justas, bem fundamentadas e em prazo razoável.
O acesso amplo à Justiça
representa uma verdadeira “idéia-força” que tem fomentado inúmeras proposições
legislativas no curso da história recente. Antes mesmo do advento da Reforma do
Poder Judiciário, entre tantos exemplos que buscaram qualificar a ação do Poder
Judiciário brasileiro, nas perspectivas da celeridade e efetividade, a Lei
8.952, de 1994, introduziu o instituto da antecipação dos efeitos da tutela,
promovendo uma verdadeira revolução no direito processual, pois permitiu a
própria satisfação do direito, em determinadas circunstâncias, antes mesmo da
própria prolação da decisão de mérito.
No âmbito da jurisdição do
trabalho, a idéia de antecipação da tutela em situações específicas já estava
consagrada, embora com terminologia imprópria (cautelar), em situações como as
das transferências abusivas e dispensas ilegais de dirigentes sindicais (CLT,
art. 659, IX e X).
Com as medidas de antecipação dos
efeitos da tutela, inscritas nos artigos 273 e 461, ambos do CPC, a lógica do
amplo e efetivo acesso à Justiça ganhou um novo significado, na medida em que
os ônus decorrentes da chamada “demora patológica” do processo, aquela
resultante das chicanas e expedientes protelatórios, da incapacidade estrutural
do Poder Judiciário de responder em tempo razoável as demandas e mesmo do
chamado “tempo neutro” (períodos em que os autos permaneciam parados, aguardando
medidas administrativas de execução, como expedição de notificações, intimações
etc), puderam ser compartilhados equitativamente entre os litigantes.
Para além do próprio é sério
debate em torno da existência de direito subjetivo à concessão de liminar ou à
antecipação da tutela, quando preenchidos os requisitos legais, não se
tratando, portanto, de matéria afeta à faculdade do julgador, é preciso que
também sejam garantidos aos litigantes iguais oportunidades de defesa de suas
pretensões e posições jurídicas, independentemente da posição que ocupem na
relação jurídica processual, cabendo ao magistrado construir interpretações que
assegurem a realização desse ideal, sob pena de inescusável
inconstitucionalidade.
[1] “Os incidentes do processo são resolvidos pelo próprio Juízo ou
Tribunal, admitindo-se a apreciação do merecimento das decisões interlocutórias
somente em recursos da decisão definitiva.” (CLT, art. 893, § 1o.).
[2] DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. IRRECORRIBILIDADE. Na Justiça do Trabalho, nos
termos do art. 893, § 1º, da CLT, as decisões interlocutórias não ensejam
recurso imediato, salvo nas hipóteses de decisão: a) de Tribunal Regional do
Trabalho contrária à Súmula ou Orientação Jurisprudencial do Tribunal Superior
do Trabalho; b) suscetível de impugnação mediante recurso para o mesmo
Tribunal; c) que acolhe exceção de incompetência territorial, com a remessa dos
autos para Tribunal Regional distinto daquele a que se vincula o juízo
excepcionado, consoante o disposto no art. 799, § 2º, da CLT.” (Súmula 214 do TST).
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quinta-feira, 17 de outubro de 2013
PLANEJAR - NARRATIVAS DE UM JUÍZO ITINERANTE Por MÁRCIO ROBERTO ANDRADE BRITO Juiz do Trabalho
PLANEJAR
época de chuva é um calvário; estradas deterioradas; buracos; animais na
pista; falta de visibilidade; névoa; e água, muita água; o caminho se torna
mais longo; troca de pneus; pane no veículo; o risco de atrasos torna-se maior;
o medo de não chegar a tempo vai atormentando juiz e servidores durante o
percurso; não podemos falhar com quem está aguardando ansiosamente pela solução
de seu problema; a angústia não pode, entretanto, suplantar a necessidade de
segurança da equipe; temos que dirigir com cautela; percebi que é preciso
planejar melhor o roteiro; prever os infortúnios; pegar estrada à noite por
estas regiões é uma insanidade; resolvi que um expediente (manhã ou tarde) deve
ser inteiramente destinado ao deslocamento, independentemente da distância a
ser percorrida (100 km, 200 km, 300 km, etc.); e de que devemos estar com
antecedência razoável nos locais de audiência, nem que para isso seja
necessário pernoitar no município de destino; planejar, palavra cujo verdadeiro
significado nós aprendemos nestas idas;
quinta-feira, 10 de outubro de 2013
MENOR APRENDIZ - NARRATIVAS DE UM JUÍZO ITINERANTE Por MÁRCIO ROBERTO ANDRADE BRITO Juiz do Trabalho
APRENDIZ
quinta-feira, 3 de outubro de 2013
CAFÉ DA MANHÃ - NARRATIVAS DE UM JUÍZO ITINERANTE Por MÁRCIO ROBERTO ANDRADE BRITO Juiz Titular da Vara do Trabalho
CAFÉ DA MANHÃ
O hotel de Taguatinga é um grande corredor com 18 aposentos; piso de
cimento queimado; portas de alumínio; ouvimos tudo o que se passa nos quartos
vizinhos; sabem até a hora que o juiz apaga a luz ou desliga a TV; privacidade zero; hora do café da manhã; a equipe já
acordou mais cedo e foi preparar a sala no foro onde serão realizadas as
audiências; neste intervalo, tomo café-da-manhã numa das quatro mesas do
refeitório; tudo lotado; é necessário compartilhar a mesma mesa com outros
hóspedes; uns puxam conversa; prefiro dizer apenas um “bom dia”; quem está de
terno provavelmente é advogado; outros podem ser litigantes; não posso
demonstrar uma intimidade que não existe; minha imparcialidade poderia ser
injustamente questionada por quem assistisse à cena; a equipe chega para me buscar;
já no estacionamento, todos os que estavam no refeitório entram em seus
veículos e fazem o mesmo percurso em direção ao foro; um comboio de
“reclamados” e “advogados”; sentaríamos novamente à mesma mesa, agora da sala
de audiência, já constrangidos a ultrapassar aquele “bom dia” matinal para
então discutirmos as causas postas a julgamento; a partir da viagem seguinte,
quando chego ao hotel, já sou cumprimentado pelos hóspedes que agora me
conhecem; “olá doutor, fez boa viagem?”; ali convivemos muito de perto com o
nosso público; compartilhamos os mesmos obstáculos; dividimos o mesmo espaço;
aprendi naquela experiência que juiz e sociedade são entes verdadeiramente
indissociáveis;
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