domingo, 31 de julho de 2016

"Francisco Fausto Eterno" - Por Grijalbo Coutinho


Francisco Fausto Eterno
Grijalbo Fernandes Coutinho

        É muito triste receber a notícia dando conta do falecimento do Ministro Francisco Fausto Paula de Medeiros, com quem estabeleci laços de amizade após muitos entendimentos e pequenos desentendimentos, ele na Presidência do TST e eu na da Anamatra. 

    Tratava-se de um verdadeiro animal político, o juiz do trabalho que resgatou a imagem interna e externa da Justiça do Trabalho, depois da tempestade neoliberal que ganhou corações e mentes no TST a partir dos anos 1990, cujo ápice desse triste momento se deu sob a presidência de um certo vaidoso tufão decididamente alucinado para acabar com o Direito do Trabalho. 

        Fausto fez o caminho inverso, denunciando e comandado a mudança da jurisprudência trabalhista, ouvindo inclusive todos os graus de jurisdição e a ANAMATRA, bem como advogados e membros do MPT, na alteração e cancelamento de seus antigos enunciados, além de usar a comunicação externa com vigor para defender o Direito do Trabalho e a Justiça do Trabalho, com o auxílio do competente jornalista Irineu Tamanini.

    Foi  também Fausto que recuperou a  imagem externa  da Justiça do Trabalho após o escândalo envolvendo a construção do fórum trabalhista de São Paulo,  não apenas por exigir  transparência em todas as obras executadas pelo Poder Judiciário, agora  com o acompanhamento rigoroso da fiscalização externa desde o início e com a sua execução pelos bancos públicos, como também não se cansava ele de mostrar a nobre função do Judiciário Trabalhista, ao conferir efetividade aos Direitos Humanos da classe trabalhadora contemplados em diplomas jurídicos diversos, nacionais e internacionais.

    Fausto esteve na linha de frente do combate ao trabalho escravo e infantil, aliando-se à OIT- Organização Internacional do Trabalho e ao conjunto de entidades comprometidas com a causa, incluindo a Anamatra, sempre falando em alto tom e fornecendo dados para a adoção de políticas com o propósito de banir o trabalho degradante. Enfim, foi o ilustre potiguar o responsável pelo início do ativismo político no TST. Para além de dirimir conflitos, o tribunal passa a se manifestar a partir de Fausto com autoridade a respeito dos mais diversos temas sociais afetos às relações de trabalho, o que nem sempre é possível fazê-lo com igual agilidade no enfrentamento judicial propriamente dito.

       Francisco Fausto, juiz corajoso, desde os tempos de sua marcante atuação em Pernambuco (TRT 6), poeta, profundamente culto, crítico político, sem vaidades ou receios de falar a dura verdade em suas intervenções contundentes dirigidas aos sujeitos situados no andar de cima do mundo econômico e político.

      Ao contrário do estilo light e conciliador do nosso querido amigo Faustinho, seu filho, juiz do trabalho do TRT 10, Francisco Fausto gostava de comprar boas brigas com os "donos do mundo", movido pelo seu aguerrido sentimento mais pernambucano do que mesmo potiguar de Areia Branca-RN. 

      Sem nenhum exagero, a história da Justiça do Trabalho, do ponto de vista institucional, é uma antes e outra bem diferente depois da Presidência de Francisco Fausto no TST.  Essa não é apenas a impressão de um fã ou admirador, de um amigo na hora da irreparável perda humana. É o retrato do que está expresso em pelo menos uma dezena de pesquisas acadêmicas no campo da sociologia, da história e da ciência política, uma delas coordenada pelo Professor Luiz Werneck Viana do IUPERJ, destacada autoridade acadêmica no estudo das relações de trabalho no Brasil, assim como existem outras investigações não menos relevantes produzidas pelas brilhantes Professoras e Pesquisadoras Ângela de Castro Gomes, Elina Pessanha e Regina Morel, da FGV, da UFRJ e da UFF.

   Realmente, ficaria o dia todo escrevendo aqui sobre a lenda da Justiça do Trabalho Francisco Fausto Paula de Medeiros, com quem tive pequenos desentendimentos quando presidi a ANAMATRA, tendo a honra, porém de dele receber uma dedicatória muito especial, em sua obra clássica ("Viva Getúlio"), com os seguintes dizeres: "Ao Grijalbo, apesar do diabo do controle externo, com um grande abraço".

Dotado de um humor refinado, não consigo me esquecer que ao adentrar ao gabinete do Presidente Fausto na companhia dos colegas Tadeu Alkmim e Hugo Melo, ele olhou fixamente para mim e soltou: "para sindicalista, comunista e jornalista nunca se deve contar nada, muito menos segredo". Completou:  "Grijalbo, estou em dúvida se você se inclui em uma das categorias ou é integrante das três ao mesmo tempo", com uma gargalhada profunda, informando, então, que o ataque ao projeto do negociado sobre o legislado precisava passar antes por uma construção interna no âmbito do TST para depois ser divulgado amplamente. Respondi: "Ministro, falei em nome da Anamatra e isso, por enquanto, com todo o respeito, o associado me deu o direito de fazê-lo, além de ter esclarecido que acreditava não ser outra a posição do TST diante da gravidade da proposta nefasta do Poder Executivo".

  Outro pequeno desencontro aconteceu quando a Anamatra, sob a minha presidência, em dezembro de 2003, aprovou proposta favorável à criação do controle externo do Poder Judiciário, no bojo do debate sobre a Reforma do Poder Judiciário em curso, tudo com ampla divulgação pelos meios de comunicação. O Presidente do TST, Ministro Fausto, me liga e reclama da deliberação, com toda a sua veia firme, educada e respeitosa. Respondi a ele que o CNJ era o caminho último para debelar mazelas internas por ele próprio combatidas, mas que respeitava demais a sua opinião em sentido contrário. E ainda acrescentei a necessidade primordial da ANAMATRA e do TST manterem os seus pontos de vista e as suas diferenças de forma respeitosa, ou seja, a convivência fraterna nas adversidades.

  Finalmente, em setembro de 2004, quando a Anamatra emitiu nota condenando os abusos na utilização dos interditos proibitórios  para coibir a greve nacional dos bancários e enfatizando a necessidade  de  reposição salarial justa frente aos lucros obtidos pelo sistema financeiro, o Presidente Francisco Fausto também não gostou porque o dissídio de greve ainda não havia sido julgado pelo TST, quando mais uma vez travamos salutar discussão, sem quaisquer agressões, até porque o perfil humanista de Francisco Fausto Paula de Medeiros não lhe permitia agredir as pessoas, muito menos os sujeitos dotados de poderes menores do que os seus.

   Com todo o respeito aos demais, Francisco Fausto não foi apenas o maior Presidente do TST de todos os tempos, senão, talvez, o mais rico, destemido e importante personagem  integrante da Justiça do Trabalho em sua história quase centenária, tão  grandioso foi o seu papel em momentos decisivos, entre outros,    i)na participação decisiva para o fim da representação classista(ele ainda não era o presidente do TST em 1999, mas liderou a elaboração de uma carta pelo então Presidente Wagner Pimenta dirigida aos deputados defendendo o fim da sinecura); ii)no resgate dos cargos de juiz do tribunal para a carreira(foram 148 em todo o Brasil); iii) na extirpação da era neoliberal no TST; iv)na retomada do papel histórico e razão de ser da Justiça do Trabalho, no sentido de resgatar a principiologia protetiva trabalhista, para tanto, promovendo o início da guinada no TST, inclusive com o cancelamento de alteração de muitos enunciados no ano 2004, em sua primeira fase ;v) na denúncia pública e no engajamento do TST na luta contra o trabalho escrevo e infantil; vi) na recuperação da imagem da Justiça do Trabalho após escândalos diversos; vii)no restabelecimento do diálogo franco e aberto com o movimento associativo de juízes, especialmente com a ANAMATRA; viii) na defesa de um serviço público de qualidade; ix)no fortalecimento da Justiça do Trabalho, com a criação de novas varas e fomento à Justiça itinerante para chegar aos  mais distantes locais; x) na intolerância contra a formação das denominadas "listas negras" criadas por entidades empresariais para discriminar empregados que demandavam na Justiça do Trabalho, inclusive determinando ele a retirada de dados das páginas dos tribunais que permitiam a pesquisa  movida por interesses mesquinhos  e  xi)  na denúncia externa contra as famigeradas comissões de conciliação prévia, que depois resultou em importante decisão do Supremo Tribunal consagradora da inconstitucionalidade, por violação ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, dos dispositivos legais que cuidavam da passagem obrigatória das demandas pelo filtro administrativo solapador de direitos sociais. 
          Fausto mudou a cara do TST, de um tribunal odiado pelos movimentos sociais mais à esquerda, especialmente depois da fatídica decisão contra a greve dos petroleiros em 1995. Com a sua postura corajosa, Fausto foi ovacionado em congresso nacional da CUT por mais de mil sindicalistas de todo o Brasil, ao defender o Direito do Trabalho. As propostas que pretendiam acabar ou mitigar a Justiça do Trabalho foram se esvaindo a partir de cada intervenção de Fausto. O resultado foi o seu fortalecimento com a EC 45/04. Os Congressos internacionais por ele organizados (nas instalações do TST), com a participação de juristas e cientistas sociais nacionais e estrangeiros, tiveram também essa tônica, no sentido de demonstrar aos próprios ministros a razão de ser da diminuição do Direito do Trabalho.

   Francisco Fausto pode não ter sido o maior jurista integrante dos quadros do Tribunal Superior do Trabalho, tipo de avaliação por demais guardada de subjetividade, natural e evidentemente. Contudo, foi o personagem que, a partir de sua rasgada atuação como presidente do TST, mais influenciou o órgão de cúpula da Justiça do Trabalho a cumprir a verdadeira missão da Justiça do Trabalho, sempre focada na sua razão de ser e do próprio Direito do Trabalho. Ninguém mais do que ele provocou reviravolta tão significativa no âmbito do TST, mudando definitivamente a história de um órgão do Poder Judiciário acostumado com o figurino do juiz introspectivo e conservador. Como ele costumava dizer, citando cientista político francês,  o que  foi repetido no seu  discurso de  posse na Academia Nacional de Direito do Trabalho, em 2004, na cidade de Brasília-DF,  os maiores juízes do trabalho não são necessariamente os mais refinados juristas senão aqueles capazes de captar de forma inteligente e dialógica, do ponto de vista sociológico e histórico, as injustiças e as desigualdades ainda  presentes na relação entre capital e trabalho na sociedade de mercado globalizada tecnológica atual. Fausto, com certeza, era um desses cientistas imprescindíveis a qualquer instituição pública preocupada com a justiça social e o destino da humanidade. 
 Saudades, saudades para valer do Ministro Fausto, cuja obra política e jurídica em defesa do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho será eternizada para sempre, cujo destemor talvez fosse a face mais visível desse singular e rico personagem da Justiça do Trabalho. 

  Meus sentimentos ao amigo Luiz Fausto, aos demais familiares e à sua legião de admiradores espalhados pelo Brasil.

    É evidente que não é possível contar a história de Francisco Fausto Paula de Medeiros em rápidas palavras. Aos mais novos apenas digo, meninos, eu vi Francisco Fausto, para mim, com certeza, o maior personagem da História da Justiça do Trabalho de todos os tempos.

     Sai de cena o maestro vigoroso da Justiça do Trabalho. Fica a sua trajetória de luta e o seu exemplo para serem imortalizados, uma memória integrante do que há de mais grandioso na história da Justiça do Trabalho, na sua fase mais comprometida com a efetividade dos Direitos Humanos da massa de explorados e excluídos da sociedade moderna.

   Descanse em paz, Ministro Fausto, grande humanista!  Lutaremos bravamente contra os coveiros do Direito e da Justiça do Trabalho, assim o fazendo também em nome do que o senhor e o seu espírito de luta aguerrida significaram concretamente para instituições fundamentais ao Estado Democrático Direito e Social. 

   Com profundo pesar, 

Grijalbo Fernandes Coutinho 
  Ex presidente da Anamatra (maio de 2003 a maio de 2005)


NOTA DE PESAR - A ACADEMIA BRASILIENSE DE DIREITO DO TRABALHO - ABRADT

NOTA DE PESAR

A ACADEMIA BRASILIENSE DE DIREITO DO TRABALHO - ABRADT, neste ato representada por seu Presidente, vem a público registrar o mais profundo pesar pelo falecimento do Ministro FRANCISCO FAUSTO PAULA DE MEDEIROS, ocorrido em Natal-RN, no último dia 30.7.2016.

Como homem, juiz, ministro e presidente da mais alta Corte de Justiça Trabalhista, Francisco Fausto teve atuação memorável e lutou pela construção de uma verdadeira Justiça Social.

Magistrado exemplar, marcou sua trajetória com equilíbrio e bom senso, reafirmando, sempre, a verdadeira vocação da Justiça do Trabalho: a harmonização verdadeira das relações entre o capital e o trabalho.

À frente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), mercê de sua liderança, logrou fundar um tempo de grande harmonia, dedicando sua gestão ao combate ao trabalho escravo, à implantação das Varas itinerantes e à valorização da Justiça do Trabalho.

O legado do Ministro Fausto deve servir de inspiração às novas gerações de magistrados, pela firmeza, coragem e determinação em bem servir a sociedade.

Ao tempo em que lamenta profundamente a perda do grande homem e magistrado, a ABRADT registra sua solidariedade aos familiares do inesquecível Ministro Francisco Fausto, rogando a Deus que lhes ofereça o conforto necessário à superação desse triste momento.

Brasília 31 de julho de 2016. 


DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES - Presidente

sábado, 30 de julho de 2016

NOTA DE FALECIMENTO - FALECEU O MINISTRO APOSENTADO DO TST FRANCISCO FAUSTO DE PAULA MEDEIROS


30 de julho de 2016

A AMATRA10 SE ENTRISTECE E LAMENTA O FALECIMENTO DO MINISTRO FRANCISCO FAUSTO DE PAULA MEDEIROS
 


A Justiça do Trabalho perde um de seus grandes ícones.  Morreu hoje, dia 30/07/2016,
 aos 81 anos, em Natal (RN), o Ministro Aposentado do TST: FRANCISCO FAUSTO DE PAULA MEDEIROS, natural de Areia Branca(RN).
Quando o Ministro Fausto esteve à frente da presidência do TST, no período de 2000 a 2004,  produziu várias revoluções, eliminando retrocessos sofridos pelo direito do Trabalho.
Entre as várias bandeiras de luta, importante destacar a defesa da existência da Justiça Trabalhista, cuja extinção também foi cogitada àquela época; a extinção da representação classista paritária; a ampliação do número de vagas no TST; a luta contra a prevalência do negociado sobre o legislado; a luta contra o trabalho escravo e tantas outras que engrandeceram a Justiça do Trabalho.
O ministro Francisco Fausto soube levar e mostrar à sociedade a verdadeira finalidade e a importância da Justiça do Trabalho
Enfim, a Justiça do Trabalho perde um grande lutador e, acima de tudo, um excelente "SER HUMANO".

quinta-feira, 28 de julho de 2016

CORTE NO ORÇAMENTO DA JUSTIÇA DO TRABALHO - MAIS UM TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO AMEAÇADO DE FECHAMENTO - TRT 11

Notícias 




Maria das Graças Alecrim Marinho informou que “é uma possibilidade real” a paralisação das atividades jurisdicionais e administrativas da Justiça do Trabalho.

Justiça do Trabalho no Amazonas pode parar atividades, diz presidente
 28 de julho de 2016 37 Views Amadeus, Atividades, Justiça do Trabalho, presidente



Manaus – Em nota oficial divulgada na manhã desta quinta-feira (28), a presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (TRT11), Maria das Graças Alecrim Marinho, informa que “é uma possibilidade real” a paralisação das atividades jurisdicionais e administrativas da Justiça do Trabalho no Amazonas e Roraima, a partir do próximo mês de agosto, por falta de recursos financeiros.
A nota diz que “caso continue a atual situação orçamentária, a partir do mês de agosto, não haverá mais recursos financeiros para pagamento das despesas necessárias à manutenção das atividades essenciais ao funcionamento normal das unidades judiciárias e administrativas que compõem o TRT11” e que , “portanto, apesar das medidas de contenção de despesas adotadas, o TRT11 não disporá de orçamento para honrar com os contratos em andamento, inviabilizando a continuação de suas atividades jurisdicionais e administrativas”.
Maria das Graças Alecrim Marinho diz que “é do conhecimento de todos que o Executivo, visando a equilibrar sua política de gastos públicos, implementou uma série de cortes orçamentários, aprovados pelo Poder Legislativo. Só no ano de 2015, o TRT11 sofreu três dessas medidas restritivas” . E que, “no ano de 2016, tais cortes orçamentários atingiram proporções inimagináveis. Cerca de 30% no custeio, rubrica que envolve contratos com empresas fornecedoras de energia, combustível, manutenção, limpeza e conservação, água, segurança e vigilância, motoristas, copeiragem, internet, passagens aéreas e material de expediente em geral, aluguéis, estagiários e contratos de TI”.
Segundo a nota “na área de investimento, o corte atingiu o patamar de 90%, inviabilizando construção e reforma de edifícios-sede e fóruns trabalhistas, além de aquisição de mobiliário e novos equipamentos de informática, indispensáveis para manter funcionando o Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho – PJe-JT, responsável pelo avanço experimentado na qualidade da prestação jurisdicional da Justiça do Trabalho em nível nacional”.
No âmbito restrito do TRT11, em 2016, segundo Maria das Graças Alecrim Marinho, as despesas de custeio foram orçadas pelo corpo técnico do Regional em pouco mais de 54 milhões. Ela informa, ainda, que o Conselho Nacional da Justiça do Trabalho (CSJT), ao enviar para o Congresso o pedido orçamentário, reduziu para 39 milhões. “A Casa Legislativa aprovou efetivamente 28,7 milhões, ou seja, 25 milhões a menos que o valor inicialmente previsto e 10,4 milhões abaixo do orçamento solicitado pelo CSJT. Isso significa um corte de 47,5% sobre o valor requerido pelo TRT e de 26,6% sobre o montante orçado pelo Conselho Superior’, diz.
A nota diz, também, qeu estão incluídas na verba de custeio o orçamento destinado aos trabalhos das Varas Itinerantes (Corregedoria) e à formação e ao aperfeiçoamento de servidores e magistrados (Escola Judicial), cujas atividades já se encontram suspensas em sua quase totalidade. “Se colocarmos aparte esses recursos, sobrarão exatamente R$ 16.350.851,00. Até o final do mês de julho todas as contas serão pagas em sua integralidade, atingindo o montante de R$ 15.443.337,37. Contudo, para os próximos cinco meses até o final do ano de 2016, a despesa mensal necessária para manter os contratos atuais será de R$ 2.206.191,05. Multiplicando a despesa mensal por cinco (agosto, setembro, outubro, novembro, dezembro), resulta num déficit de pouco mais de 11 milhões”, detalha.
A presidente do TRT11 informa que tomou inúmeras medidas saneadoras de despesas, que resultaram numa economia de cerca de 3 milhões de reais, reduzindo para 9 milhões o déficit financeiro do Regional no final do presente exercício. Dentre elas está a redução dos contratos nos limites da lei (25%), diminuição do número de estagiários, suspensão de alguns contratos de TI e redução do consumo de combustível e energia elétrica.
A nota encerra dizendo que  “a paralisação do TRT11 por falta de recursos, como visto, é uma possibilidade real”. E que “o quadro espelha-se por muitos outros dos 24 Regionais do País” e que, por esse motivo, os presidente dos Tribunais Trabalhistas reunir-se-ão em Brasília na primeira semana de agosto, com o fim de encontrar soluções legais e negociais à crise orçamentária e financeira que assola a Justiça do Trabalho.


Mentir na Justiça do Trabalho é crime e precisa ser punido



Mentir na Justiça do Trabalho é crime e precisa ser punido

Rodrigo Trindade de Souza. Presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 4ª Região – AMATRA-IV.

As instituições costumam ser construídas por fatos, pessoas e ideias. E também por fantasias e preconceitos. A Justiça do Trabalho não escapa, e carrega diversos estereótipos, o mais grave: “toda mentira é permitida”.
Arrancar os olhos não nos faz enxergar melhor e é hora de enfrentar as críticas com seriedade, destemor e vontade de progredir.
Mais do que em qualquer outro ramo do Judiciário, na Justiça do Trabalho é comum haver depoimentos com versões absoluta e absurdamente divergentes. Enquanto não avançarem projetos de alteração legislativa, o juiz trabalhista não possui autoridade para processamento de crimes, como o falso testemunho, e tem de se limitar a escolher uma das versões e providenciar ofícios para investigação da falta pela Polícia Federal e Ministério Público Federal.
Isso é pouco. A mentira não pode ser vista como corriqueira, natural, burocrática.
A jurisdição apenas terá utilidade social e será reconhecida como virtuosa se for produzida a partir de supostos mais nobres que o ardil, a mentira, a esperteza. Os juízes gaúchos possuem compromisso ético muito bem definido. Não haverá Justiça do Trabalho eficaz se optarmos por ignorar práticas disseminadas que maculam o ofício e prejudicam a correta distribuição do justo.
Além de moralmente reprovável, mentir como testemunha na justiça trabalhista é crime que pode ser apenado com prisão e pagamento de multa. Não basta os faltosos serem apenas advertidos, é necessária certeza da punição firme e adequada.
Desde já estabelecemos iniciativa de engajamento incessante no combate às práticas processuais desleais, especialmente o falso testemunho. Nossa associação, a AMATRA IV, inicia amplo programa de auxílio aos juízes para identificação das práticas criminosas, encaminhamento aos órgãos investigativos competentes e contínua participação nos inquéritos processuais criminais. Em breve, essa campanha será ampliada e buscará alertar toda a sociedade.

Trata-se de objetivo ambicioso e inédito em todo país, mas quando tratamos de valores como ética e verdade, não há como pensar pequeno. Nem fazer concessões.

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Cortes orçamentários ameaçam segurança nos tribunais, alerta Anamatra


25 de julho de 2016


Cortes orçamentários ameaçam segurança nos tribunais, alerta Anamatra
 


A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) divulgou na tarde desta segunda (25/7) nota de solidariedade ao juiz do Trabalho Luís Eduardo Casado, da 17ª Região, que sofreu ameaça de morte por parte de um reclamante, no exercício de sua função de juiz titular da comarca de Colatina/ES, na última sexta (22/7). “Estou muito preocupado, mas recebendo bastante apoio dos colegas, advogados e também da Presidência do Tribunal”, relata o magistrado.

Segundo a Anamatra, o fato não é isolado e reflete a falta de segurança no Poder Judiciário, respaldada, inclusive, por pesquisa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que aponta que apenas 2% dos servidores e 11,3% dos trabalhadores terceirizados do Poder Judiciário atuam na área de segurança e que muitos tribunais sequer possuem quadro próprio especializado na área.

A nota ressalta que, na Justiça do Trabalho, o cenário vem se agravando devido aos cortes orçamentários sofridos no ano passado, o que tem demandado o racionamento de despesas básicas para que a prestação jurisdicional não cesse. “A prestação jurisdicional efetiva pressupõe o respeito às instituições públicas, sendo urgente a adoção de políticas que garantam condições seguras de trabalho para os magistrados e servidores do Poder Judiciário para que a sociedade possa ser recebida e atendida também de forma segura e efetiva”, defende a Anamatra.

A Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 17ª Região (Amatra 17/ES) também divulgou nota sobre o episódio, na qual afirma que os cortes orçamentários tiveram impacto direto na Justiça do Trabalho do estado. “Nós tínhamos dois vigilantes armados na Vara e agora temos apenas um. Os cortes orçamentários vêm impactando não apenas no fluxo de trabalho, mas no atendimento à população de forma segura”, aponta o presidente da entidade, Fábio Bonisson Paixão.

Exemplo de MG – O cenário da 3ª Região é outro exemplo do que preocupa a Anamatra. Em um dos maiores tribunais trabalhistas do Brasil, foram suprimidos 42 postos de vigilância. Com isso as trinta varas do Trabalho do interior não dispõem de qualquer tipo de vigilância ou controle de acesso, situação não diferente de Belo Horizonte, que conta com apenas três seguranças para atender os dois prédios que abrigam as 48 varas da capital.

O juiz Glauco Becho, presidente da Amatra 3 (MG), lembra que o estado de Minas Gerais tem histórico de atentados em suas unidades, entre eles a explosão de caixa eletrônico (Uberlândia e Araguari), incêndio criminoso (Barbacena), agressões no interior dos Fóruns (Foro de Belo Horizonte e Contagem) e, já após os cortes, invasão na Vara do Trabalho de Pirapora. “A Amatra 3 vem atuando em prol da regularização regional, mas é imprescindível solução orçamentária capaz de assegurar não só o retorno da vigilância, mas, principalmente, a implementação de medidas amplas e efetivas  capazes de garantir a tranquilidade e a segurança dos magistrados”, explica.

Confira abaixo a íntegra da nota:

Nota de solidariedade

A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), entidade que reúne nacionalmente juízes do Trabalho, vem a público se solidarizar com o juiz do Trabalho Luís Eduardo Casado, da 17ª Região, que sofreu ameaça de morte por parte de um reclamante, na última sexta-feira (22/7), no exercício de sua função de juiz titular da comarca de Colatina/ES, sendo encaminhado à Delegacia do município pela autoridade policial local.

A Anamatra ressalta que a segurança no Poder Judiciário é algo que demanda uma maior atenção e que situações de ameaças têm se tornado mais frequentes em todos os ramos. Pesquisa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aponta que apenas 2% dos servidores e 11,3% dos trabalhadores terceirizados do Poder Judiciário atuam na área de segurança e que muitos tribunais sequer possuem quadro próprio especializado na área.

Na Justiça do Trabalho, o cenário vem se agravando devido aos cortes orçamentários sofridos no ano passado, o que tem demandado o racionamento de despesas básicas para que a prestação jurisdicional não cesse. Exemplo desse cenário é o da 3ª Região, um dos maiores tribunais trabalhistas do Brasil, no qual foram suprimidos 42 postos de vigilância. Com isso, as trinta varas do Trabalho do interior não dispõem de qualquer tipo de vigilância ou controle de acesso, situação não diferente da capital, que conta com apenas três vigilantes para atender os dois prédios da Justiça de 2º grau.

A Anamatra reafirma que a prestação jurisdicional efetiva pressupõe o respeito às instituições públicas, sendo urgente a adoção de políticas que garantam condições seguras de trabalho para os magistrados e servidores do Poder Judiciário para que a sociedade possa ser recebida e atendida também de forma segura e efetiva.

Brasília, 25 de julho de 2016

Germano Silveira de Siqueira

Presidente da Anamatra

“Não se pode ‘conciliar’ a qualquer custo” - Artigo Publicado no BLOG DO FRED



POR FREDERICO VASCONCELOS
artigo publicado no site: 

Sob o título “Conflitos trabalhistas: qual conciliação?”, o artigo a seguir é de autoria de Guilherme Guimarães Feliciano, juiz titular da 1ª Vara do Trabalho de Taubaté (SP) e vice-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).*

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No último dia 23 de junho, o Conselho Nacional de Justiça realizou audiência pública para discutir o tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito da Justiça do Trabalho. Entre os objetivos do evento estava a definição de diretrizes para a estipulação de uma política de conciliação na Justiça do Trabalho e o debate de questões polêmicas como a necessidade da instalação de núcleos ou centros específicos de conciliação/mediação no 1º e 2º graus de jurisdição da Justiça do Trabalho e o cabimento da mediação privada e/ou pré-processual no processo do trabalho. Vale a pena trazer ao leitor alguma notícia do que ali se debateu e dos seus possíveis reflexos para a jurisdição trabalhista.

Para muitos entusiastas da ampliação das políticas de soluções alternativas de conflitos trabalhistas, o recurso intensivo às conciliações e mediações torna-se a panaceia para os problemas atuais da Justiça do Trabalho — notadamente em tempos de carestia orçamentária, com corte de mais de 29% em suas verbas de custeio e de 90% em suas verbas de investimento, para 2015 (Lei 13.255/2016) —, uma vez que, sem recursos orçamentários, conviria recorrer a instrumentos que “facilitem” a solução dos litígios trabalhistas típicos. Além disso, ante o desemprego crescente (taxa acumulada de 11,2% no início de junho) e o aumento vertiginoso de demandas nos órgãos da Justiça do Trabalho, restaria à instituição antecipar-se ao boom de litígios e servir-se de mediações e conciliações “pré-processuais”, evitando a afluxo dessas demandas como ações judiciais.

A nosso ver, tais razões revelam apenas o equívoco por detrás desse novo frenesi pelos métodos alternativos de solução de conflitos trabalhistas. A jurisdição é uma função de Estado voltada à tutela de direitos subjetivos e/ou de interesses juridicamente protegidos; e, logo, um mecanismo para o acesso pleno à ordem jurídica justa, que é mais que a simples “pacificação” dos conflitos.

Não se pode “conciliar” a qualquer custo, tanto mais quando estão em jogo direitos sociais fundamentais, de natureza alimentar, como são os salários, as horas extraordinárias, as verbas decorrentes da rescisão contratual etc. Já por isso, devem-se evitar os acordos ruinosos (p.ex., frações de verbas rescisórias incontroversas a se pagar em parcelas a perder de vista), simulados (p.ex., acordos celebrados em juízo, para pagamento integral de rescisórias, apenas para o efeito de se obter quitações plenas em favor de empresas devedoras de outros direitos), fraudulentos (p.ex., acordos que ocultam ou alteram naturezas jurídicas irrevogáveis das parcelas a serem pagas, com o adrede intuito de evadir tributação) ou temerários (p.ex., acordos que “vendam vento”, oferecendo direito futuro, incerto e/ou litigioso).

Nenhum método alternativo de solução de conflitos que se guie por critérios de massificação, priorização qualitativa ou legitimação por precificação/quantificação será adequado para esse controle. Cabe ao juiz do Trabalho zelar por essa condição de eticidade nas conciliações; servidores judiciários ou conciliadores/mediadores privados, no seu lugar, não terão sequer competência — no sentido técnico-processual — para essa aferição.

Os núcleos judiciais de solução alternativa de conflitos são evidentemente bem-vindos na Justiça do Trabalho, como em qualquer outro ramo do Judiciário. Mas devem se balizar pela natureza especial das pretensões que estão em disputa. E têm de ter à frente de toda e qualquer negociação, a se encetar apenas no curso de processos judiciais já instaurados, a figura do juiz.

Se há conjuntura de explosão da litigiosidade, as dificuldades daí advindas precisam ser contornadas por outros mecanismos, como a simplificação dos ritos, as tutelas provisórias de urgência e de evidência, a racionalização dos sistemas recursais e, por que não, o aumento dos quadros de juízes e servidores (basta lembrar que há, na França, doze juízes por cem mil habitantes; no Brasil, na Justiça da União, há um único magistrado para cada cem mil habitantes). Recorrer a uma lógica que busque prioritariamente métodos de extinção/prevenção de procedimentos é, a rigor, desconstruir o próprio conceito contemporâneo de jurisdição, que é função estatal de tutela jurídica. Não poderá ser jamais método estatal para “qualquer” solução de conflitos.

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(*) O autor é Doutor, Livre-Docente e Professor Associado II da Faculdade de Direito da USP.

sábado, 23 de julho de 2016

AMATRA 10 SE ENTRISTECE COM O FALECIMENTO DE EVARISTO DE MORAES FILHO. O MUNDO DO TRABALHO PERDE UM GRANDE JURISTA

22 de julho de 2016


Anamatra lamenta falecimento do jurista Evaristo de Moraes Filho
 

O Direito do Trabalho perdeu, na noite desta sexta (22/7), um de seus grandes estudiosos no Brasil. Morreu, aos 102 anos, no Rio de Janeiro (RJ), o advogado trabalhista Evaristo de Moraes Filho. O corpo do jurista será velado na Academia Brasileira de Letras (ABL), onde ocupava, desde 1984, a cadeira de número 40.

Dedicado à causa dos direitos sociais, da democracia e do humanismo, o jurista deixa expressivo legado para aqueles que atuam com esses temas. "As importantes contribuições do professor Evaristo de Moraes Filho, especialmente para o Direito do Trabalho, ficarão na memória e na prática de todos os  magistrados, membros do Ministério Público e advogados comprometidos com os direitos sociais. Fica nossa solidariedade à família," destaca o presidente da Anamatra, Germano Siqueira.

Entrevista - Em 2007, Evaristo de Moraes Filho recebeu a equipe da TV Anamatra, em sua residência na capital fluminense, onde falou um pouco mais sobre a sua trajetória de vida, sempre em defesa dos direitos sociais. "Na Revolução Francesa, falou-se que, na luta entre o fraco e o forte, a liberdade escraviza e a intervenção do Estado liberta. Se deixar a raposa e as galinhas soltas no galinheiro sem um poder soberano, não há dúvidas que as raposas vão vencer. E o Direito do Trabalho é isso", afirmou na ocasião.

Relembre a entrevista, disponível em quatro partes.


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sexta-feira, 22 de julho de 2016

A JUSTIÇA DO TRABALHO NÃO SE RESUME A UM SÓ TRIBUNAL. A JUSTIÇA DO TRABALHO É O CONJUNTO DE 24 TRIBUNAIS REGIONAIS DO TRABALHO


A JUSTIÇA DO TRABALHO PODE PARAR



Ironicamente, durante um período de escalada de desemprego e de conflitos laborais, a Justiça do Trabalho pode fechar as portas ao seu público. Simplesmente porque não há dinheiro para seu custeio. Seu orçamento é insuficiente.

Poder-se-ia dizer que não há surpresa neste fato (orçamentário) uma vez que – como é público e notório – todo o aparato estatal (União, Estados e Municípios) tem sofrido com a crise econômica que assola o país. A justificativa, entretanto, para o caso da Justiça do Trabalho, não é tão simples.

A Justiça do Trabalho está sob ataque, astuto e dissimulado. Nenhum outro ramo do Judiciário Federal teve corte tão profundo quanto o infligido ao orçamento destinado à Justiça do Trabalho. De maneira simplista, o corte foi duas vezes maior que reservado a Justiça Federal. A razão de ser de tal discriminação está registrada no relatório do Deputado Ricardo Barros – atual Ministro da Saúde – atinente à Lei orçamentária anual 2016:

– Na Justiça do Trabalho, “as regras atuais estimulam a judicialização dos conflitos trabalhistas, na medida em que são extremamente condescendentes com o trabalhador”.

– “…A situação atual é danosa às empresas e ao nosso desenvolvimento econômico, o que acarreta prejuízos aos empregados também”

– “É fundamental diminuir a demanda de litígios na justiça trabalhista”
Em síntese, com base em sofismas, buscou-se paralisar uma Justiça que é efetiva e cuja efetividade parece incomodar. Incomoda também a Justiça Federal com a operação Lava Jato e, talvez por isso, recentemente, esta passou a atuar sob a sombra do projeto de lei 280/2016 do Senado Federal, que visa punir atos jurisdicionais, praticados por juízes e promotores, como abuso de autoridade. Neste caso, resta claríssimo o objetivo de paralisar uma justiça também efetiva.

Já que a Justiça do Trabalho não conseguiu ser paralisada – pelos incomodados – através da via legislativa, com eventuais óbices em cláusulas constitucionais pétreas, restou a asfixia pela via orçamentária. Como observou o Ministro do STF Celso de Mello, no recente julgamento da ADI 5468: “cortes drásticos e discriminatórios da Justiça do Trabalho podem inviabilizar o funcionamento da instituição”. E tais cortes, efetivamente, inviabilizaram.

O Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região, cuja jurisdição compreende os Estados do Amazonas e Roraima, em função do citado corte orçamentário, mesmo após reduzir todo gasto possível (energia, terceirizados, contratos), só tem recursos para manter seus serviços até o mês de setembro deste ano. A Medida Provisória 740/2016, que abriu crédito extraordinário para Justiça do Trabalho, destinou recursos insignificantes ao TRT da 11ª Região. O problema persiste.

A Justiça guardiã da legislação trabalhista precisa, com urgência, do apoio da sociedade, a destinatária final dos seus serviços.
Sem apoio e sem aporte orçamentário, em setembro de 2016, a Justiça do Trabalho do Amazonas e de Roraima pode parar.

Manaus, 19 de Julho de 2016.
SANDRO NAHMIAS MELO
Presidente da Associação dos Magistrados

da Justiça do Trabalho da 11ª Região – AMATRA XI

O cotidiano de uma trabalhadora terceirizada narrado por uma juíza

Esse artigo foi publicado no site



Juíza do trabalho narra o caso de Dona Zefa, trabalhadora terceirizada da limpeza. Com delicadeza, a magistrada retrata um cenário cruel e perverso de trabalhadores que são invisíveis e desvalorizados no empurra-empurra da terceirização trabalhadora terceirizada limpeza.


Em artigo para o Justificando, a juíza do trabalho Juliana Ribeiro Castello Branco conta o caso de Dona Zefa, trabalhadora terceirizada da limpeza na Justiça do Trabalho. “Dona Zefa é a que limpa o banheiro, que pede licença para tirar o lixo do gabinete, varre, espana, lava, e também é aquela que, de quando em quando, senta-se à mesa de audiência, na condição de reclamante”.

A história dela é de superação, trabalho duro, crescimento pessoal e profissional. Mas a realidade do trabalhador terceirizado é difícil. “A terceirização esfacela as relações pessoais, enfraquece o associativismo, impede a organização de pleitos coletivos e cria castas entre empregados e terceirizados, com direitos, salários e tratamento diferenciados. Este instituto, que os defensores afirmam ser imprescindível do ponto de vista econômico, é nefasto sob o aspecto social”.

Por Juliana Ribeiro Castello Branco*

Dona Zefa chegou para trabalhar na vara, em substituição a outra, outra igual à Dona Zefa, “terceirizada da limpeza”, que por um motivo qualquer “não foi aproveitada pela firma que ganhou a licitação”.

É assim, e tem sido assim desde os idos de 1993, quando a Súmula 331 do TST consolidou a jurisprudência sobre a matéria e estabeleceu, para aplausos da maioria, que a terceirização gerava responsabilidade subsidiária do tomador. Em tese, Dona Zefa e as iguais, estavam garantidas. Qualquer problema com seu empregador, não as impediria de ter acesso aos seus direitos constitucionais trabalhistas. Aquele que se beneficiou de sua força de trabalho, deveria assumir a responsabilidade pelo pagamento dos seus direitos.

Isso amenizava os efeitos da terceirização, que vinha para ficar, e até hoje anda rondando, pronta para nos engolir. Como um leão[1].

A terceirização esfacela as relações pessoais, enfraquece o associativismo, impede a organização de pleitos coletivos e cria castas entre empregados e terceirizados, com direitos, salários e tratamento diferenciados.

Este instituto, que os defensores afirmam ser imprescindível do ponto de vista econômico, é nefasto sob o aspecto social.

O trabalho nessa condição atinge a autoestima do empregado, que nunca terá capacitação para fazer parte da empresa na qual presta seus serviços, uma vez que sua atividade é meio e não está incluída na finalidade da empresa. Normalmente ele não entende bem isso. Mas o lugar que o colocam, isso ele entende. E esse lugar não tem nenhum destaque. É um trabalhador de segunda classe. Ali o colocam, ali ele fica. Fazem a limpeza, enquanto os intelectuais decidem o futuro do país.

Faz tempo que isso começou. Vinte anos depois, da teoria comemorada à prática vivenciada, constata-se que D. Zefa, não só não teve seus direitos garantidos como, após sucessivas transferências de empresa, assumiu a condição de empregada e cliente da Justiça do Trabalho, invisível nas duas situações.

Dona Zefa é a que limpa o banheiro, que pede licença para tirar o lixo do gabinete, varre, espana, lava, e também é aquela que, de quando em quando, senta-se à mesa de audiência, na condição de reclamante.

Entra muda, sai calada, cumprindo a formalidade que a lei determina de comparecer em juízo para tentar o tão esperado acordo. No caso da D. Zefa, a conciliação nunca vem. No máximo um alvará para levantamento do seu FGTS – o que estiver depositado. No mais, esperar. O ente público, sem rosto, recorre, recorre e recorre. E depois da alteração da já referida Súmula 331, na qual foi acrescentado o item V, relativizando a responsabilidade do tomador, até consegue se isentar da responsabilidade subsidiária, caso se entenda que fiscalizou o contrato.

D. Zefa não entende. Seu patrão não é a própria Justiça do Trabalho? Não é ali que trabalha, na vara? E não é lá que as pessoas vão buscar solução para os seus problemas trabalhistas? Não é lá que os juízes condenam quem está errado a pagar o que deve?  Mas quem é seu patrão afinal de contas? Esse patrão tão poderoso e tão omisso. Ele é invisível para Dona Zefa, como Dona Zefa é invisível para a Justiça do Trabalho.

Mas Dona Zefa trabalha, não desiste. Teve filho cedo, vai ser avó, embora não tenha 50 anos. E sua filha segue seus passos, também vai ter filho cedo. Filho é uma alegria, neto, melhor ainda. Dona Zefa não reclama, não pensa na crise.

Chega sorrindo, vai tentando estabelecer vínculos que tornem aquele trabalho mais suportável. A saída pelos afetos, o que nos preenche. E assim, passa a ir bem cedinho à vara e se oferece para fazer o café, e passa a tomar o café com a gente, conversa, mostra fotos, conta da família, dos seus problemas, passa a limpar nossos banheiros duas vezes por dia. Quando falta material, nos recompensa dando prioridade na distribuição do papel higiênico. Ganha carinho, retribui com trabalho. Afinal, nada é de graça, muito menos para ela. E não pensa na crise, Dona Zefa trabalha.

Dona Zefa não é mais Dona Zefa, agora é Zefinha e, com o tempo participa das comemorações dos aniversários e das festinhas que fazemos na vara no Natal. Em vez de só mostrar suas fotos, passa a sair nas fotos.

Sorridente, alegre, finalmente tem colegas de trabalho. Nunca soube o que era isso. Como cada “terceirizada da limpeza” cuida de um andar do prédio, não se falam durante o expediente. Na hora do almoço, descansam e fumam em pé, no estacionamento. É nessa hora e nesse local, que se relaciona com suas iguais. Mesmo assim, nada fala do patrão, já que não o conhece. Na verdade, nem sabe bem o nome dele, nunca viu ninguém que se apresentasse como tal. Só pegaram sua carteira de trabalho, deram baixa no contrato e assinaram de novo. As empresas prestadoras de serviço contratadas pelo Tribunal se sucedem. Mas Zefinha não as conhece, nem sabe onde ficam. Tudo foi feito nas dependências da Justiça do Trabalho, mas “tudo dentro da Lei”.

Até que ele aparece, seu empregador aparece nos noticiários. Seu empregador era uma empresa de fachada, ligada a políticos corruptos de Duque de Caxias. Fraude, desvio de dinheiro e toda essa sujeira. De novo Zefinha não entende nada, mas o que dizem seus pares, é que se deram mal. Isso ela já tinha concluído. Outra vez. Só o FGTS, pelo que está depositado.

E Zefinha sente o quanto o sistema a considera, substituível e descartável.

Um dia, ao chegar ao trabalho, sinto falta da Zefinha. Não veio? Está doente? Não, Zefinha arrumou um emprego, foi ser doméstica na casa de uma funcionária do TRT. Está contente. A funcionária é uma pessoa legal e estava precisando de empregada doméstica. Zefinha tem referência, trabalha bem, é de confiança.

Zefinha subiu um degrau. Virou doméstica. Seu empregador agora tem nome, tem endereço e tem rosto.

E Zefinha? Zefinha não fala da crise, trabalha. Zefinha é uma leoa. E mata um leão por dia, mas é presa fácil para quem acha que o máximo que ela deve ter é um emprego de doméstica.

Não houve despedida. É uma pena. Também não sei se haveria algo a  dizer, diante da perplexidade que essa situação me causa.

Mas hoje, tenho a oportunidade de dar à Zefinha um lugar de destaque: o protagonismo desse texto.

E vamos pautando a sororidade.


*Juliana Castello Branco é mulher, mãe, foi juíza do trabalho da 12ª Região (Santa Catarina) e atualmente é juíza do trabalho da 53ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro. Associada à AMATRA1 (Associação dos Magistrados da 1ª Região), à ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho)  e  membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia). Adora programar e fazer viagens, ler poesias e ouvir MPB. Entusiasta do pensar e fazer coletivos, acredita que a sororidade não vai mais sair de pauta.
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[1] Tramita no Congresso, desde 2004, o PL 4330 que amplia o alcance da terceirização. Sem falar fazer distinção entre atividade-meio e atividade-fim, o texto permite a terceirização sem restrições. Em abril de 2015, foi aprovado na Câmara e atualmente aguarda julgamento pelo Senado Federal.

A aprovação desse projeto importa em colocar milhões de trabalhadores na mesma condição da D. Zefa. Não se trata somente de uma questão econômica. É a dignidade do trabalhador que está em jogo.

terça-feira, 19 de julho de 2016

ENTREVISTA COM O NOVO PRESIDENTE DA AMATRA IV - DESTAQUES PARA O CORTE NO ORÇAMENTO E PARA A TERCEIRIZAÇÃO

ENTREVISTA

 Notícia da edição impressa de 19/07/2016. Alterada em 18/07 às 18h21min

'Se não houver complementação de orçamento, haverá fechamento de portas'



Catharina Signorini, especial

Um dos compromissos do juiz Rodrigo Trindade de Souza na Amatra IV é reduzir o falso testemunho


JONATHAN HECKLER/JC


No dia 3 de junho, a Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da IV Região (Amatra IV) elegeu como seu novo presidente o juiz Rodrigo Trindade de Souza, que irá comandar a associação até 2018. Nesta entrevista para o Jornal da Lei, o magistrado enfatizou os projetos que irão nortear a sua gestão e apresentou um panorama dos desafios que a Justiça do Trabalho está enfrentando.
Jornal da Lei - Em linhas gerais, quais são os principais projetos para a sua gestão?
Rodrigo Trindade de Souza - Existem dois projetos que são pautas mais externas à nossa vida associativa e que possuem maior relação com a sociedade. O primeiro deles diz respeito a esse grande problema do falso testemunho na Justiça do Trabalho. Cada ramo do Judiciário tem os seus lugares comuns, as suas lendas, as suas fantasias. As pessoas costumam dizer que a Justiça do Trabalho é a justiça que sempre favorece os empregados e é a justiça em que todo mundo chega, mente para o juiz, o juiz acredita em todas as mentiras e produz condenações fabulosas contra os empresários, que andam muito bonzinhos e não deveriam ser condenados. Mas a gente precisa entender o que é fantasia e o que é realidade, e por que surgiram essas ideias comuns. E por isso é importante que a gente admita que, de fato, corre muita mentira sobre a Justiça do Trabalho. As testemunhas mentem muito, mesmo, não têm muitos pruridos. Precisamos entender por que isso acontece e, principalmente, mudar a cultura de se aceitar isso como algo mais ou menos natural, que não se possa fazer nada contra. Por que as pessoas mentem tanto na Justiça do Trabalho? Há varias teorias sobre isso, mas me parece que a mais adequada é o fato de que não se vê punição. As pessoas mentem porque parece que nada vai acontecer com elas. De todos os ramos do Judiciário, a Justiça do Trabalho é o único que não tem competência criminal. Se uma testemunha mente na frente do juiz estadual ou do juiz federal, ele tem condições de promover o processamento dessa pessoa pelo crime de falso testemunho. A Justiça do Trabalho ainda não tem esse tipo de competência. Então, quando uma testemunha mente para o juiz, o que ele tem que fazer é produzir um ofício dizendo que acredita que essa testemunha mentiu, enviar o ofício para a Polícia Federal (PF) e para o Ministério Público Federal (MPF), e eles, de acordo com circunstâncias próprias desses órgãos, vão decidir pela investigação e pelo processamento do crime. Normalmente, há uma grande dificuldade desses órgãos no processamento e na condenação de testemunhas. Se você fizer uma pesquisa jurisprudencial e for verificar quantas pessoas foram efetivamente punidas pela Justiça Federal pelo crime de falso testemunho, vai ser um número extremamente pequeno. E é muito comum os juízes terem produzido esses ofícios e não terem visto resultado. E isso estimula outras testemunhas a mentir. Há um problema moral, muito grave, de as pessoas aceitarem a mentira como algo natural.
JL - E o que pode ser feito para reverter esse cenário?
Souza  - Não temos como resolver, mas há um problema institucional da falta de punição. E a nossa instituição, a Amatra IV, resolveu dizer que agora basta, chega disso, é preciso tratar a sério o problema do falso testemunho, que desmoraliza a jurisdição. Não só a jurisdição trabalhista, mas desmoraliza o Poder Judiciário. Pensamos, então, em quatro grandes atuações para reverter esse quadro. A primeira delas é criar condições para que os juízes do Trabalho identifiquem as circunstâncias de falso testemunho. Vamos produzir uma cartilha detalhada, com identificação das circunstâncias de falso testemunho. A segunda é estimular os colegas para que eles encaminhem essas situações de falso testemunho para os órgãos competentes. Em terceiro lugar, e isso é inédito no País, a nossa associação vai atuar como assistente de acusação nos processos federais e vai atuar também nos inquéritos na PF. Há pouco mais de um mês conversei com o superintendente da PF e ele se mostrou bastante sensível a isso, vai aceitar a participação do nosso advogado criminalista. Vamos ter reuniões com o MPF para tentar sensibilizar. Eu entendo que essas duas organizações - o MPF e a PF - têm muito trabalho, com situações de potencial punitivo e de perigo para sociedade muito maiores do que essa situação, mas a situação que enfrentamos é grave, e são necessárias algumas condenações exemplares para mostrar que isso basta, chega, não vai acontecer mais. Os juízes do Trabalho do Rio Grande do Sul não vão aceitar mais a mentira na Justiça do Trabalho como algo natural. Em quarto lugar, vamos fazer uma ampla campanha de divulgação na sociedade do perigo que é, e da inadequação, de faltar com a verdade na Justiça do Trabalho, esclarecendo todos os efeitos penais, punitivos, do falso testemunho. Esse é um compromisso institucional que temos, até de sobrevivência da Justiça do Trabalho. Se a gente aceita a mentira nesse único ramo do Judiciário, em breve vamos estar dizendo que a Justiça do Trabalho é um ramo menor, e isso não é possível. De modo algum, estou dizendo que há uma prática generalizada da advocacia trabalhista de instruir testemunhas para que mintam. A advocacia trabalhista gaúcha é a melhor do Brasil. Tenho imensa admiração pela qualidade da advocacia trabalhista gaúcha. A maioria absoluta é de advogados preparados, inteligentes e honestos. Mas existe uma minoria que contamina bastante a percepção do que seja esse trabalho. Há fundados indícios de que poucos advogados trabalhistas, uma minoria, atua de forma indevida na instrução de testemunhas. Isso nós não vamos permitir também.
JL - Em relação ao outro projeto da gestão...
Souza - Nosso segundo projeto é o do tratamento eficaz das demandas massificadas. Ações que são compartilhadas em vários processos poderão ter encaminhamentos completamente diferentes. Queremos oferecer um tratamento adequado às chamadas demandas de massa. É muito comum que uma situação equivocada, de uma empresa, com 300 ou 400 funcionários, produza 300 ou 400 processos individuais. Não faz sentido, por uma situação de fato única, eu ter três ou quatro centenas de processos. É importante que haja um tratamento adequado dessas demandas massificadas, de oferecer um tratamento uniforme para essas ações. Isso vai ser muito importante para não mais abarrotar o Judiciário.
JL - Muitas notícias tratam dos sérios problemas que os Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) estão enfrentando em razão do corte orçamentário. Como dar continuidade à prestação jurisdicional nessa situação?
Souza - Precisamos rememorar o que aconteceu. Em 2015, foi produzida a Lei Orçamentária Anual, com destinação de recursos para a Justiça do Trabalho. Esses recursos foram cortados de forma desproporcional no que tange à Justiça do Trabalho. Houve um corte geral no Poder Judiciário, mas na Justiça do Trabalho o corte foi muito superior a todos os demais ramos. Para se ter uma ideia, houve uma diminuição de mais de 30% das verbas de custeio e 90% das verbas de investimento. Por que o corte na Justiça do Trabalho foi maior? A informação que foi dada pelo relator do orçamento, deputado Ricardo Barros (PP-PR), é de que esse corte ocorreu porque a Justiça do Trabalho protegia, indevidamente, o trabalhador, e o corte deveria ocorrer para que o juízes do trabalho repensassem essa postura e buscassem alteração da legislação. Segundo o deputado, são muitas condenações das empresas, que passam a ter dificuldades de funcionamento em razão do Direito do Trabalho ser protetivo. Não existe Direito do Trabalho, no planeta inteiro, que não seja protetivo ao trabalhador. Se uma relação de trabalho é regrada pela identificação de que as partes são economicamente desiguais, é Direito do Trabalho.
JL - Qual o impacto do corte no serviço prestado?
Souza - Esse corte de orçamento foi desproporcional e houve um desvio de finalidade, o objetivo não foi econômico, de adequação do orçamento à realidade econômica do País. A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, que foi julgada improcedente porque se reconhecia a constitucionalidade na atribuição do Congresso de definir o orçamento. Porém, praticamente todos os ministros do Supremo Tribunal Federal afirmaram que era indevido o corte, que o Congresso Nacional deveria complementar o orçamento. A situação que se coloca é que, atualmente, praticamente todos os TRTs do Brasil não têm dinheiro para manter a atividade até o final de agosto. Se não houver complementação de orçamento, vai haver fechamento de portas. Não é porque não pode investir, porque não pode pagar salário, mas sim porque não tem como pagar água, luz, segurança, climatização. Não tem dinheiro. Recentemente foi editada a Medida Provisória nº 740, de liberação de verbas que estavam indevidamente retidas. O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região vai receber cerca de R$ 29 milhões. Mas isso não é complementação de verbas, é oriundo de uma retenção, já eram do tribunal e se destinavam a investimentos. Como há esse problema de orçamento, essa verba, que era de investimento e que estava retida, vai ser direcionada para pagamento de custeio. Se não houver uma política forte no Congresso Nacional e no Poder Executivo, isso pode se manter no ano que vem. É algo muito grave.
JL - Muito se tem falado sobre a elaboração de documento de defesa do Direito e da Justiça do Trabalho. Quais são os principais pontos elencados neste documento?
Souza - Este é um documento que foi produzido pelos ministros do Tribunal Superior Eleitoral, e depois foi aderido por um número gigantesco de juízes do Trabalho pelo Brasil inteiro. E o objetivo é pontuar o entendimento da necessidade de defesa dos princípios de Direito do Trabalho e demonstrar que somos contrários às reformas trabalhistas que busquem a precarização do Direito. Atualmente, no Congresso Nacional, existem 50 projetos de reforma da legislação do trabalho, praticamente todos eles para tornar precário o Direito, para fazer com que o trabalho seja mais barato para o empresário e que haja um rol menor de benefícios para os trabalhadores. São três grandes projetos com que temos que lutar de forma mais aguerrida. O primeiro - e eu acho que é o mais grave -, são os projetos de diminuição da idade mínima para o trabalho. Atingimos um patamar civilizatório exemplar no planeta, embora haja ainda muito a avançar, como a proibição de qualquer trabalho para menores de 18 anos, com exceção dos menores aprendizes. Porém, existem projetos que chegam a diminuir para até 12 anos a idade mínima do trabalhador. Ou seja, de regredir aos patamares do século XIX.
JL - Em algumas regiões do País essa cultura é mais forte.
Souza - Aqui no Rio Grande do Sul é muito comum as pessoas entenderem que há necessidade de as pessoas trabalharem desde pequenas, acredito que pela tradição que temos de trabalho rural, do colonato. Desde pequenas, as crianças trabalham na colônia e  se acostumam com o trabalho. Isso cria a ideia de que pessoas que começam a trabalhar mais cedo possuem melhores chances de ter um sucesso profissional maior, e, estatisticamente, isso não é verdade. No mundo inteiro é assim, e no Brasil também, diversas são as estatísticas que mostram. Quanto mais cedo se começa a trabalhar, menores as chances de ter um crescimento econômico e cultural. Há um círculo vicioso de perpetuação de pobreza quando as pessoas começam a trabalhar mais cedo. As crianças não têm que trabalhar. As crianças têm que se formar e viver o ludismo da infância. Há tempo para tudo, há tempo para trabalhar e há tempo de brincar e estudar. A Anamatra atua de forma muito firme no Congresso Nacional, é uma das únicas instituições que faz isso, fazendo o esquadrinhamento e o acompanhamento de todos os projetos. Produzimos memoriais e notas técnicas sobre todos os temas importantes de Direito do Trabalho, e esse é um tema muito importante. O segundo tema relevante são os projetos da supremacia do negociado sobre o legislado. Atualmente, no Brasil, temos uma regra legal que diz que, quando um determinado direito está previsto na lei, a negociação coletiva não pode produzir normas para pior. Então, se diz na lei que a hora extra tem um adicional de 50%, não pode a negociação coletiva dizer que a hora extra vai ser de 30%. Isso porque nem sempre os sindicatos têm poder suficiente para negociar, com igualdade de armas, condições piores do que as previstas em lei. O problema da supremacia do negociado pelo legislado é que sempre se pressupõe um poder e uma representatividade, independentemente do sindicato, e nem sempre ela existe. E isso pode contaminar de forma muito tensa esses normativos coletivos, que podem vir a ser prejudiciais à lei. Atuamos de forma muito firme contra isso.
JL - E o terceiro item?
Souza - O terceiro item é o da terceirização. A terceirização é um problema muito grave. No mundo inteiro, a terceirização é uma opção administrativa das empresas para que elas possam se focar na atividade fim, e a atividade meio elas deixam para outras empresas especializadas. Em uma empresa especializada em produzir agendas, o trabalho de limpeza, de conservação, de segurança, não é o objetivo dessa empresa, então ela terceiriza para outras. No Brasil, a terceirização tem outro foco, que é o de redução de custos. Eu quero reduzir meus custos de produção, então eu terceirizo para uma rede de empresas satélites que fazem parte da produção por um preço muito menor. Para que esse preço seja menor, é necessário que haja uma redução de custos dessas empresas. E aí é matemático: se uma empresa tem que produzir lucro para duas empresas, para si e para aquela contratada, ela tem que reduzir muitos seus custos, e no Brasil essa redução de custos ocorre, principalmente, com a precarização do trabalho, com a sonegação de direitos trabalhistas, com a sonegação de direitos previdenciários, não pagamento de horas extras, contratação de autônomos, quando deveriam ser empregados. E isso causa problemas muito graves.