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Por que tantas ações trabalhistas?
Por que tantas ações trabalhistas?
Artigo:
Rodrigo
Trindade
Presidente
da AMATRA IV
Culpar
Direito e Justiça do Trabalho por um problema exorbitante não passa de uma mal
explicada opção política. A pergunta que precisa ser respondida é por que há
tanto descumprimento das obrigações trabalhistas?
Semana
passada, ministro do STF por quem costumava nutrir admiração acadêmica,
palestrou no Reino Unido e reclamou que o Brasil possui cerca de 98% das ações
trabalhistas do planeta. Atirou o dado e defendeu reforma legislativa.
Não é a
primeira vez que leio e escuto a aspereza dessa estatística. O inusitado é que,
mesmo tão repetida e requentada, ninguém, até hoje, conseguiu indicar a origem.
Como correntes de tias neófitas em redes sociais, segue reenviada, sem qualquer
preocupação de verificação de fonte.
De
qualquer forma, é certo que produzimos muito mais demandas oriundas de
conflitos entre empregados e empregadores que gostaríamos. A explicação pode
estar em outras estatísticas, mas essas de fontes oficiais. Os gráficos são do
Conselho Nacional de Justiça e de lá extraímos algumas pistas.
Para
entender tanta litigiosidade, proponho usar dois recursos fotográficos:
primeiro, abrir o foco, alcançando toda a paisagem; depois, dar aquele superzoom
que captura até os poros mais constrangedores.
O
primeiro gráfico revela a dureza das velhas culpas. Não gostamos de admitir,
mas formamos sociedade de delinquentes e litigantes, em que cumprimento
voluntário da lei é visto como exceção. Convivemos naturalmente com dívidas
certas, ocultamento de patrimônio e recursos inconsequentes ao infinito. Temos
dificuldades de lidar com adimplemento espontâneo, evitamos soluções negociadas
e preferimos imposições pelo Judiciário. A cultura da extrema litigiosidade
está longe de ser monopólio do Judiciário Trabalhista. Ao contrário.
A campeã
absoluta de ações é a Justiça Estadual, com 69,3% das demandas. Esse é o ramo
do Judiciário que cuida, entre outras matérias, de criminalidade, litígios de
família e ações de consumidor. Se queremos cimentar a regra de culpa na
obesidade legislativa, não há dúvidas que descriminalizar condutas, eximir de
cuidar da infância negligenciada e liberar contratos de consumo aliviará
estatísticas judiciárias. O problema será, então, explicar como lidaremos com
(ainda mais) criminosos perambulando pela rua, (ainda mais) crises familiares
permanentes e (ainda mais) abusividade em contratos de consumo.
A Justiça
Federal, que praticamente tem apenas um réu, possui 13,4% das ações. E, para
diminuir a litigiosidade daquele lado, a fórmula fica bem mais simples: basta a
União deixar de ser a maior recorrente do país e abster-se de abarrotar
tribunais com recursos natimortos.
A Justiça
do Trabalho tem número parecido com a Federal, 14,9%, e para entender,
precisamos apertar o zoom e conhecer o que ali costuma se postular.
O segundo
gráfico mostra que as demandas mais recorrentes não são de teses pitorescas,
aventuras jurídicas ou testes acadêmicos. A imensa maioria de ações versa sobre
rescisão de contrato e verbas rescisórias.
Ou seja,
cobra-se na Justiça do Trabalho o mês ou a vida de serviço, que se encerrou sem
nem mesmo pagar salário e depositar FGTS. As ações são resultado do clássico
recado "Você está despedido e vá buscar seus direitos". E as pessoas
vão. Também poderiam resolver a golpes de tacape, mas aí já não seríamos mais
Estado.
Culpar
Direito e Justiça do Trabalho por um problema exorbitante não passa de uma mal
explicada opção política. A pergunta que precisa ser respondida é por que há
tanto descumprimento das obrigações trabalhistas? Burocracia e detalhamento
legislativo fazem parte da resposta, mas estão longe de encerrarem toda a
motivação. Não há fórmula fácil, mas a redução de ações somente ocorrerá como
resultado da diminuição da delinquência patronal - premiar os bons e punir
adequadamente os maus.
Não é
nada fácil ser empresário no Brasil. O problema é que descumprir a lei
trabalhista também é fácil e, muitas vezes, estimulada por juros irrisórios,
indenizações ínfimas e apostas em acordos judiciais. Resolver esses problemas
pode ajudar bem mais que repetir estatísticas fantasmas.
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