terça-feira, 7 de março de 2017

CÓPIA DA DECISÃO QUE MANTEVE A DETERMINAÇÃO DE DIVULGAÇÃO DA LISTA SUJA


Veja a cópia da decisão do Desembargador Pedro Foltran, Presidente do TRT da 10ª Região.

"PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª                     REGIÃO
Gabinete Gabinete da Presidência
SLAT 0000097-06.2017.5.10.0000
AUTOR: UNIÃO - PROCURADORIA REGIONAL DA UNIÃO DA 1ª REGIÃO
RÉU: MINISTERIO PUBLICO DO TRABALHO DA 10  REGIÃO

DECISÃO

A UNIÃO requer a suspensão de tutela provisória concedida na ação civil pública n.º0001704-55.2016.5.10.0011.
O Juízo da 11ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, ratificando liminar anterior, ordenou à União e ao Ministro de Estado do Trabalho que publiquem, em trinta dias, o cadastro dos empregadores que possuam decisão administrativa proferida a partir de 1º/7/2014 referente ao art. 444 da CLT (trabalho escravo), bem como que, excepcionalmente, oportunizem a "celebração de acordo judicial ou TAC" com os administrados incluídos "na primeira publicação" do cadastro que possuam "decisão administrativa final de procedência do auto de infração" antes da edição da Portaria Interministerial n. 4/2016 (idd9af620).
A requerente alega que a decisão gera grave lesão à ordem pública, pois autoriza a divulgação de cadastro de empregadores que "tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo", sem conferir aos interessados a necessária segurança jurídica.
Informa, ainda, que a Portaria nº 04/2016, que dispõe sobre os critérios a serem observados na elaboração do cadastro, está sendo revisada por grupo de trabalho instituído no âmbito do órgão ministerial, tendo em vista que foram constatadas falhas e imperfeições no documento.
Assim, conclui, a divulgação de lista construída sobre critérios que estão sendo questionados e reanalisados pelo próprio órgão que os editou seria temerária, máxime quando seria impossível divisar a extensão dos efeitos negativos e contundentes que, inevitavelmente, segundo seu entendimento, recairão sobre os envolvidos após a divulgação dos dados.
Pois bem.
Inicialmente, destaco que as ações que tratam de suspensão de liminar ou de tutela de urgência não visam discutir o mérito da ação principal, o que obsta o pronunciamento sobre as seguintes alegações: discricionariedade de ato administrativo; prerrogativas do Ministério do Trabalho; reformulação de políticas públicas e aprimoramento das relações de trabalho.
In casu, a União busca suspender a decisão que ordenou a divulgação do cadastro de empregadores ligados à prática de trabalho em condições análogas à de escravo, pois alega que a lista pode conter informações não fidedignas, uma vez ter sido elaborada com base em critérios falhos e imperfeitos ditados na Portaria Interministerial n.º 4/2016.
Segundo o ente público, é possível que o cadastro contenha "inscrição errônea" de administrados, pois a referida portaria não contém mecanismos que resguardam, de modo amplo, "os direitos do contraditório e ampla defesa dos autuados" (id 1de0823, páginas 5 e 6).
Como visto, a questão de fundo aventada pela União é referente à exatidão das informações contidas no cadastro do Ministério do Trabalho, perpassando, ainda, pela conveniência ou não da divulgação dos dados ali registrados.
Destaque-se que qualquer discussão referente às relações de trabalho sob os moldes da escravidão é complexa, sensível e de interesse de toda a sociedade brasileira.
A exploração de mão de obra gratuita ou com remuneração vil em relação aos valores de mercado, com sujeição do trabalhador a condições de trabalho degradantes e subumanas, caracteriza a escravidão moderna.
Embora ainda não tenham sido definidas todas as ações que norteiam uma política pública objetivando erradicar o trabalho análogo ao escravo no país, o Governo Federal, isoladamente ou em conjunto com entidades da sociedade civil, vem se organizando e despendendo esforços para combater a ilegalidade, editando medidas que visam prevenir, reprimir e punir a conduta abominável.
Numa dessas ações, o Ministério do Trabalho editou a Portaria Interministerial n.º 2/2011, já revogada, que foi então substituída pela atual Portaria Interministerial n.º 4/2016 que, aprimorando o normativo anterior, atualmente fixa as regras para a formulação do "Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo".
E a União busca, justamente, suspender a decisão que determinou a divulgação do cadastro sob a tese de que as regras aplicadas na sua elaboração, ditadas pela Portaria n.º 4/2016, estão
sendo rediscutidas por comissão criada para este fim pelo próprio órgão que as instituiu (Ministério do Trabalho).
Assevera, ainda, que há dúvidas sobre a exatidão dos registros e que é possível que o direito de defesa não tenha sido amplamente conferido aos empregadores listados no documento.
De fato. Não se ignora a potencialidade nociva que a divulgação de dados errôneos, eventualmente existentes no cadastro, possam gerar ao ente público e aos administrados, pois a associação de empresas ao trabalho em condições análogas ao de escravo é situação que provoca efeitos negativos para a imagem dos envolvidos que, comumente, não são minorados ou esquecidos pela sociedade no decurso do tempo. Todavia, não há como conceber que a inclusão de nome de empresas no cadastro se dê de forma inconsequente. Fosse assim, o próprio agente público estaria reconhecendo gravíssimas falhas em sua mais legítima atuação de modo a tornar duvidoso o resultado das ações engendradas para a erradicação do trabalho escravo.
As atuações do órgão fiscalizador em relação à apuração do trabalho escravo são rígidas e os autos de infração somente são expedidos quando o processo administrativo de cada empregador foi analisado em todas as instâncias e possui decisão irrecorrível (art. 2º, § 1º, do normativo).
Ou seja, a inclusão de um nome no cadastro constitui a etapa final de todo um procedimento fixado por normas específicas editadas, repita-se, pelo próprio Ministério do Trabalho, órgão da Administração Federal responsável e estruturado para apurar as denúncias de irregularidades e fiscalizar o trabalho em todo o território nacional.
Ademais, destaque-se que, no presente momento, os termos da Portaria Interministerial n.º 4/2016 estão vigentes. Como bem consignado pelo Juízo, a criação de a quo grupo de trabalho destinado a aperfeiçoar sua redação "não suspende, expressa ou implicitamente, a vigência da Portaria atual" (id 4ba2d98, pág. 6), até porque houve tempo suficiente - desde a sua edição - para que as citadas ações de aperfeiçoamento tivessem sido concretizadas.
A União também não aponta, especificamente, quais são os termos da Portaria n.º 4/2016 que seriam falhos, nem quais são os possíveis erros que ensejariam a inscrição equivocada de empresas no cadastro, tendo em vista que, destaque-se uma vez mais, a inclusão do empregador ocorre apenas com a decisão final desfavorável no processo administrativo.
Como já dito, embora a sociedade brasileira já esteja consciente da existência da situação aviltante e da necessidade de combate ao labor análogo ao escravo no país, pouco se tem avançado para se concretizar as medidas que, efetivamente, mostrem-se eficazes na coibição da conduta irregular.
A autorização da criação de cadastro dos empregadores ligados ao trabalho escravo, por si, não é suficiente para intimidar os praticantes da irregularidade, sendo essencial a divulgação dos dados, uma vez que ao Estado cabe, precipuamente, operacionalizar e concretizar as medidas repressivas destinadas à erradicação do trabalho irregular.
Não há, pois, como reconhecer que a divulgação do documento poderá ocasionar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas (Lei n.º 8.437/1992, art. 4º), inclusive para legitimar a própria ação do Ministério do Trabalho que enuncia ser um dos seus pilares de atuação a proteção do trabalhador, tendo em vista que a sociedade brasileira possui a necessidade premente de que o Estado adote medidas realmente eficazes que coíbam a exploração desse tipo de mão de obra.
Impedir a divulgação do cadastro, como registrado na decisão id bf87826, "acaba por esvaziar, dia a dia, a Política de Estado de combate ao trabalho análogo ao de escravo no Brasil" (pág. 19).
Assim, com base nos fundamentos expostos, concluo que o cumprimento imediato da decisão de tutela de urgência não ocasionará prejuízos irreversíveis ao ente público e aos administrados, de modo que indefiro o pedido.
Por tais fundamentos, INDEFIRO o pedido de suspensão dos efeitos da tutela provisória concedida na decisão id 4ba2d98.
Custas processuais pela requerente, isenta, no importe de R$ 20,00, calculadas sobre R$ 1.000,00, valor atribuído à causa e aproveitado para esta finalidade.
Oficie-se a 11ª Vara do Trabalho de Brasília-DF, encaminhando-se cópia da presente decisão.
Intimem-se as partes.
BRASILIA, 6 de Março de 2017
PEDRO LUÍS VICENTIN FOLTRAN
Desembargador do Trabalho"



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